sexta-feira, 25 de abril de 2014

NOS 40 ANOS DO 25 DE ABRIL - 11 - entre abril e maio

25 de Abril de 2014 às 14:30


em évora - os dias da pré-Revolução - 1974 (Abril 25 a Maio 03) 


Trova do vento que passa

Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça
o vento nada me diz.

Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das águas
e os rios não me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.

(…)

Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio -- é tudo o que tem
quem vive na servidão.

(…)

Há quem te queira ignorada
e fale pátria em teu nome.
Eu vi-te crucificada
nos braços negros da fome.

(…)

Quatro folhas tem o trevo
liberdade quatro sílabas.
Não sabem ler é verdade
aqueles pra quem eu escrevo.

Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.

Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.

                 Manuel Alegre


Pranto pelo dia de hoje

Nunca choraremos bastante quando vemos
O gesto criador ser impedido
Nunca choraremos bastante quando vemos
Que quem ousa lutar é destruído
Por troças por insídias por venenos
E por outras maneiras que sabemos
Tão sábias tão subtis e tão peritas
Que nem podem sequer ser bem descritas

Sophia de Mello Breyner

25 de Abril

Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo.

Sophia de Mello Breyner

~~~~~~

* Victor Nogueira

Há quem considere como exclusivos agentes da História os santos, os heróis, os puros, os egrégios avós. Mas, para o bem ou para o mal, os verdadeiros heróis, agentes, actores e motores da História são os das imagens seguintes:

helena vieira da silva, a poesia está na rua

helena vieira da silva, a poesia está na rua

lisboa 25 de Abril de 1974

lisboa 25 de Abril de 1974

lisboa 25 de Abril de 1974

lisboa 25 de Abril de 1974

lisboa - 1º de maio de 1974

lisboa - 1º de maio de 1974


* Victor Nogueira

Enquanto o Movimento dos Capitães (depois MFA - Movimento das Forças Armadas) procurava pôr fim a ditadura e à guerra colonial, estudantes do ISESE, numa sala das trazeiras do Café Parque,  reuniam-se para elaborar um programa e formar lista que permitissem desencadear o processo eleitoral que pusesse termo à gestão da Associação dos Estudantes por Comissões Administrativas nomeadas pela Direcção do Instituto.

(1) Em Fevereiro os estudantes dos 3 primeiros anos, que pretendiam retomar a AE através de eleições,  haviam-me proposto a Presidência  da  Mesa da Assembleia Geral e, semanas depois, que encabeçasse a lista para a Direcção da AE. Embora não estivesse disposto a ser o "Presidente" - estava prestes a terminar o curso - iniciaram-se as reuniões para elaborar o programa de actividades e  as listas para a Direcção, Mesa da Assembleia Geral e Conselho Fiscal.


No seu Relatório de Actividades a Comissão Administrativa da AE, em Fevereiro de 1974, faz uma referência aos "mais velhos"  - "não podemos deixar de recordar aqueles colegas que nos antecederam e em quem sempre encontrámos um amigo pronto a esclarecer-nos e ajudar-nos quando era necessário ... " e relativamente à  última Direcção eleita, de que eu fizera parte:  "Recebemos a Associação em razoável situação financeira, mercê da equilibrada orientação da Direcção anterior."

Esta Direcção fora em 1970/71 alvo duma violenta campanha  feita nas aulas por alguns jesuítas [que não teve eco junto da esmagadora maioria dos estudantes) e que após a crise entre a AE  e a Comissão de Festas dos Finalistas  e a saída do "Bisturi", órgão dos estudantes, levou um daqueles professores a dizer nas aulas, em vão,  que  "ou os estudantes demitiam  a Direcção da AE ou esta seria demitida pela Direcção do ISESE".

Em 26 de Abril  de 1974 o Director do ISESE pretendeu nomear uma nova Comissão Administrativa da AE de sua inteira confiança  e proibiu a realização dum Plenário de Estudantes nas instalações do Instituto.

O trabalho articulado entre o grupo que se vinha reunindo numa sala das traseiras do Café Parque e a Comissão Administrativa  da AE malogrou a tentativa de nesse dia a Direcção do ISESE nomear/impor uma CA da sua inteira confiança e possibilitou que em Plenário Geral de Estudantes, nesse mesmo dia, fosse eleita uma "Comissão Cooordenadora das Actividades da AE", responsável pela convocação dos Plenários Gerais em 1 e 3 de Maio, no último dos quais, contrariando as cautelas da Direcção do ISESE, os estudantes aprovaram uma Proclamação que passou a orientar a sua acção e a do ISESE em princípios democráticos e saudando não só o MFA mas   "todos quantos, sobretudo na clandestinidade e  com risco da sua segurança e bem-estar, têm lutado contra todas as formas de repressão e violação dos Direitos Humanos em sociedade, nomeadamente a partir da instauração da ditadura fascista em Portugal.l"

Em Março deste ano os trabalhistas haviam ganho as eleições no Reino Unido e começara a guerrilha urbana na Guiné Bissau. Duas profundas adversidades para o Governo Português. Em 16 deste mês dá-se o falhado Golpe Militar das Caldas (tentativa dos spinolistas neutralizarem  o general Kaulza de Arriaga, de extrema direita, e o Movimento dos Capitães ?) mas em 25 de Abril o poder cai na rua, apesar da farsa encenada entre as Excelências, como noticiava a RTP -  "Sua Excelência o ex-Presidente do Conselho de Ministros se rendeu incondicionalmente a Sua Excelência o General António de Spínola,"

Para além de memórias, o texto seguinte é constituído tambémcom extractos da minha correspondência da  altura.

~~~~~~~~~~

Com um ar grave e solene o locutor de serviço na Televisão comunica à hora do noticiário que a emissão prossegue com um concerto de Freitas Branco, até que sejam transmitidos os comunicados do Movimento das Forças Armadas. O emissor da Rádio Clube Português transmite música portuguesa. Aguardo que retransmitam o comunicado da prisão do Presidente do Conselho de Ministros, refugiado no Quartel da GNR, no Largo do Carmo em Lisboa.

A Rua do Raimundo, os carros nela estacionados, o pátio, o terraço, a casa de banho [da casa onde estava hospedado], estão juncados de restos de papéis queimados. Grande actividade vai ali na sede da Acção Nacional Popular (1) onde devem procurar livrar-se de papéis comprometedores.

São já quase 20 horas e um novo comunicado informa que "Sua Excelência o ex-Presidente do Conselho de Ministros se rendeu incondicionalmente a Sua Excelência o General António de Spínola,  juntamente com os ex-Ministros do Interior e dos Negócios Estrangeiros" O   Pai Tomás ainda não se rendeu.

Penso que os regimentos de Évora ainda não aderiram ao pronunciamento militar. Pelo menos nenhum dos jornais que li hoje fala em Évora, sede de uma das quatro Regiões Militares.

Foram pancadas secas as que me acordaram cerca das 8 h 30 m desta manhã, seguidas dum jorro de luz sobre os olhos e da visão do Diogo [Guerreiro] em pijama, o rádio na mão: "Ouve lá isto e vê se percebes alguma coisa!" Meio a dormir ouço, pelo rádio, um apelo aos médicos e falar nas operações iniciadas na madrugada de hoje. Estou baralhado e nada sei sobre o que estou a ouvir. A Emissora Nacional está silenciosa. Ouve-se música portuguesa, especialmente do Zeca Afonso. Durante o resto do dia segue-se a audição dos comunicados do Comando das Forças Armadas. No Instituto a malta aglomera-se junto aos automóveis com rádio. A Filomena está assustada (Tem muito medo das revoluções!) e diz que é um golpe das esquerdas. Mas nada se sabe de concreto sobre a finalidade e orientação do Movimento.

Dizem-me que os bancos estão encerrados e dou por mim a pensar se o dinheiro que tenho no bolso me chegará para o fim de semana. Felizmente que levantei ontem massas, se não estava lixado.

À cautela passo pelo Nazareth para arranjar um exemplar do "Portugal e o Futuro”, de Spínola, que não circula em Angola [proibido pela censura]  e que o meu irmão [Zé Luís] tem interesse em ler.(...)

Venho até casa para saber de que lado está a RTP. A emissão começa à hora habitual - 12:45 - e surge um locutor de olhar esgazeado, olhando para a direita e para a esquerda, ouvindo se ruídos no estúdio. A emissão é interrompida. Será um locutor do Movimento? A emissão recomeça pouco depois e a dúvida desvanece-se: o locutor, com ar atrapalhado, informa que seguir-se-á um filme da série Daktari, o telejornal das 13:45 e a Telescola. A emissão é novamente interrompida, recomeçando pouco depois com o filme anunciado: animais sendo caçados com laços.


O locutor de serviço informa que a interrupção foi devida a uma falta de energia. Por momentos pensei que fosse outro o motivo. São 20h20 A minha mãe telefonou a saber como estou. Digo-lhe que estou bem.

..

Após o almoço tentámos ouvir o noticiário da TV, às 13h 50. Mas … nada. Em vez deles um filme da série “Viver no Campo”.

Numa emissão especial da BBC às 14:45 permite saber que o Movimento contactara com os generais Spínola e Costa Gomes. Começam assim a definir-se as posições.

Nos comunicados do MFA o general Spínola é apresentado como o fiel intérprete dos sentimentos da população (que não se teria manifestado) (2) Eis o homem. Para já, teremos uma ditadura para restaurar as liberdades cívicas !

Nas ruas de Évora, durante o dia, a malta sorria-se, euforicamente, numa euforia um pouco contida.

Bem, amiga, vou jantar. Junto te envio um recorte sobre a anti-psiquiatria. (1974 ABRIL 25).

1 - Cujas traseiras dão para o pátio da casa onde moro.
2 - Ao contrário do que sucedia em Lisboa, com a população a encher as ruas e rodear os militares, determinando o rumo do Movimento, em Évora as manifestações populares foram muito comedidas.

Depois de Abril de 1974 os pedintes desapareceram das ruas de Lisboa e doutras cidades, não por qualquer medida repressiva, mas porque as condições de vida melhoraram. Vinte anos depois regressaram, tal como os encontrei na Madeira, embora muitos sejam jovens que agressivamente exigem dinheiro pela arrumação de carros em lugares que indicam, muitas vezes para aquisição de droga. Contudo não se amontoam às portas das igrejas, como outrora. (1998)

A Rádio Renascença transmite "Os Vampiros", do Zeca Afonso! Rei morto, Rei posto! A Junta de Salvação Nacional, como a si própria se intitula, abre a tarracha e já hoje tornou público o seu programa, cujo ponto limite é a realização de eleições gerais para a Assembleia Constituinte e Presidente da República no prazo de 12 meses.

No café Estrela, velhos falam dizendo que os jovens de agora são melhores que no seu tempo: “A gente também não concordava com o Salazar mas nunca tivemos coragem de fazermos o que eles fizeram."Nas imagens que a RTP transmite a nota dominante entre os manifestantes e os mirones era a juventude. Outro velho diz que nunca foi marcelista.

No Instituto o Director [António da Silva, s.j.] anda nervoso e carrancudo. Comunica à Comissão Administrativa da Associação dos Estudantes que não autoriza a Reunião Geral de Alunos convocada para essa tarde, pretende que a [referida] Comissão nomeie outra Comissão, que deverá submeter à sanção da Direcção do Instituto. A Comissão discorda, o Director desdiz-se mas exige que lhe sejam comunicados os nomes, reservando-se o direito de vetá-los. A reunião realiza-se, comparecendo 30 estudantes.

É aceite por maioria absoluta uma moção minha: "Escolher uma Comissão que terá como finalidade detectar junto dos estudantes dos problemas que os afectam enquanto estudantes., o modo de resolvê-los bem como à sua atitude face à Associação dos Estudantes"

Seguidamente 10 dos estudantes presentes oferecem-se para serem votados para constituírem essa Comissão. Decide-se que serão escolhidos os cinco nomes mais votados, que integrarão a Comissão, que fica assim constituída: Ribeiro (1º ano) - 9 votos; Luís Carmelo (2º ano Sociologia) - 11 votos; João Luís Garcia (3º ano Sociologia) - 11 votos; Faria Monteiro (1º ano) - 12 votos; Victor Nogueira (5º ano Sociologia) - 16 votos.

Quer a Direcção [do ISESE] aceite ou não, ela submeter se à a um plebiscito [entenda se, ractificação] junto de todos os estudantes.

Vamos ver o que sai daqui.

Dois professores do Instituto, altamente comprometidos com o Governo de Marcelo Caetano, os drs. Silva Leal e Amílcar Mesquita, não compareceram às aulas.

A BBC de ontem informava que a Comissão Democrática Eleitoral (dominada pelo Partido Comunista) e o dr. Mário Soares (líder do Partido Socialista Português) [ambos os partidos até agora considerados ilegais] apoiam o Movimento das Forças Armadas. Segundo o dr. Agostinho Neto do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) o golpe não seria mais que uma manobra de Marcelo [Caetano] para afastar os elementos de extrema direita, encabeçados pelo Pai Tomás [Presidente da República].

Por seu turno o Ministro da Saúde do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde) afirmou que numa entrevista à BBC que a subida de Spínola não modificará as coisas; a sua política é a do “adormecimento do povo”.

De resto, segundo a BBC, de anteontem, a situação em Moçambique não ´é muito brilhante dado que a FRELIMO controla as comunicações com a Rodésia, onde existe um governo racista branco, apesar das medidas de segurança intensificadas.

Ainda não sei se amanhã teremos exames de Estudos da População: o Cónim virá ?  O prazo para entrega dos exercícios de Técnicas de Investigação Social II foi adiado para a próxima 4ª feira. Respiro de alívio.

PS – Elementos da Polícia Secreta e do Exército Rodesianos actuariam em território de Moçambique, procurando detectar guerrilheiros da FRELIMO e anti-rodesianos. Segundo um relatório secreto de oficiais portugueses têm instruções (ou autorização) para abater todos os que possuam armas, desde que ofereçam resistência às inquirições com vista à obtenção de informações; para isso torturavam as populações, sendo esponsáveis pelos massacres ultimamente cometidos.

Como vão as coisas aí pela Amareleja?  (MCG - 1974.04.26)

O telejornal transmite a libertação dos presos políticos do Forte de Caxias. Fico indignado com as delongas: mas que história é essa da distinção entre presos de delito comum e presos políticos? Vão para o raio que vos parta, mais o vosso “percebes?”. Não percebo,  nada!

Começa a saída dos presos: reconheço alguns – o Sérgio Ribeiro, o Luís Moita. Ouço nomes conhecidos: Nuno Teotónio Pereira. E ouço as declarações de alguns dos libertos, nomeadamente [Palma Inácio] da LUAR (Liga Unida da Acção Revolucionária): aí, valentes, assim é que são! Nada de entusiasmos despropositados, nada de pactuações demagógicas. Não haja ilusões: o poder não irá para o povo; a burguesia reorganiza-se. Vamos ver durante quanto tempo durará este novo ar que se respira, duma liberdade que nunca tinha havido nos meus 28 anos de existência. É bom sentir também essa liberdade nos outros.

Sinto-me como se estivesse exausto. Nós podemos mesmo falar, podemos comunicar com os outros, podemos determinar a nossa acção, sem o dilema da marginalização pela recusa em pactuar com um governo e uma política criminosas?!

Vejo hoje no Instituto o dr. Amílcar Mesquita, o Rola, o Director do Instituto e outros professores. Sobe por mim a contrariedade que me despertam: o arrivismo, a cretinice, o autoritarismo, a desumanidade dum país de que a escola é o reflexo pela política dos jesuítas. Sobe por mim o desejo de gritar NÃO a tudo isto que profundamente abomino e que tão dolorosamente suportei durante estes seis anos de luta para não me deixar negar.

Ah! Mas a nossa luta ali no Instituto é agora conseguir o direito de associação, a liberdade de expressão de pensamento, negar o autoritarismo da  Direcção. Esta é a minha luta: NÃO à ditadura, não às fantochadas.

Vou ouvindo a BBC; por ela sei das reacções que se vão dando no mundo em como comentários interpretativos da situação. Comentários políticos têm surgido apenas no “República”. Os restantes, como o “Diário de Lisboa”, a “Capital”, o “Diário de Notícias” e o “Século” dedicam páginas inteiras à descrição dos acontecimentos, alguns com muitas fotografias.

Não acredito muito que a Junta Militar entregue o governo à população. Não acredito na neutralidade política das Forças Armadas. O Marcelo foi deposto, é certo, mas não vejo muito qual a possibilidade de instaurar em Portugal uma ordem radicalmente diferente. Ao render-se, o Marcelo foi bastante sintomático: entregar o governo ao Spínola [e ao exigir render-se apenas a Spínola quando já não tinha qualquer poder] “para evitar que o poder caia na rua” -  aquilo a que alguns chamam a “populaça”,  

Daí que o General Spínola possa lançar um apelo para evitar os excessos que possam por em causa “o poder que o General Spínola vos oferece”, diz um comunicado.  Mas ... a liberdade conquista-se. E se o “poder é oferecido” (ao povo)  por um general,  então não tenhamos grandes entusiasmos e aguardemos o desenrolar dos acontecimentos.

A Emissora Nacional transmite o seu noticiário da meia noite e transmite uma gravação (será integral?) do noticiário e comentários da BBC que ouvi há pouco !

O Partido Comunista Português pretendia declarar uma greve geral para o próximo 1º de Maio. Mas a Junta de Salvação Nacional instaurada após as 1ªs convocações - Haverá greve ou não? Ou limitar-se-á a uma convocação gigantesca? Até que ponto a SEDES e a CDE bem como os sindicatos conseguirão “controlar” a situação para não obrigar a Junta a desmentir as suas afirmações ?

Amanhã há uma reunião ou comício ali na Quinta das Glicínias, na Estrada para Arraiolos, organizado pelo Movimento Democrático de Évora. Hoje desde o Cemitério até à Praça do Giraldo, uma grande multidão - milhares de pessoas aguardaram [em Évora]  - durante mais de hora e meia pela chegada do cortejo automóvel que acompanhava os presos políticos libertados- uns 3 ou quatro, um dos quais há 12 anos ! (1) São 20h30m  está frio e começa a chuviscar. Resolvo ir a casa buscar o guarda-chuva e acabo por ir jantar uma merda dum bife nos “Manuéis”.  Quando regresso à Praça [do Giraldo] já tudo havia terminado; apenas na placa central da Praça do Giraldo um grande magote de pessoas estão comprando "A Capital". São autênticas corridas aos jornais, avidamente disputados, como os dos últimos dias. Toda a gente anda de jornal debaixo do braço ou lê-o à mesa do café ou especado na rua. Até, oh! surpresa, raparigas! (Muitas mulheres têm tanta pena do Marcelo [Caetano], coitadinho, tão simpático, tão amigo do povo!) SAFA!

A caça aos PIDES continua. E não fossem as Forças Armadas e muitos se não todos seriam chacinados, após 40 e tal anos de tortura e repressão. Contam-me que em Évora um não escapou a alguns sopapos. Geram-se situações chatas e perigosas. Alguns dos suspeitos de serem informadores da PIDE andam à rasca. Um (dos suspeitos) agarrou num dos rapazinhos (acusadores) e levou-o ao quartel-general para esclarecer a situação. Aí foi informado que quem fizesse acusações desse género sem provas terá de responder em tribunal por difamação. Dizem-me que um dos PIDES de Évora se teria enforcado na sua residência esta manhã.

Passaram hoje em Évora uma coluna de carros de assalto, jipões e jeeps. Os soldados iam sorridentes, acenavam, alguns tinham flores nos canos das armas. Os populares gritam "Obrigado, rapazes!" e eu depois tenho pena de não ter correspondido ao aceno dos militares, apesar de estar comovido.

Bem, amiga  vou deitar-me.  (MCG – 1974.04.27/28)

Não tive oportunidade de acrescentar algo mais às linhas anteriores, salvo agora, enquanto aguardo que me façam a ligação para a Amareleja.  Ando um tanto ou quanto alvoraçado e precisava de recolher-me. Para conseguir estudar que é coisa que não faço desde 5ª feira passada, no princípio de ouvido colado ao rádio e depois lendo os jornais e pormenores.

Domingo de manhã houve uma manifestação popular. À noite fui ao cinema ver " Malteses, Burgueses e às Vezes", (2) que era português e passado em Angola, nomeadamente em Luanda.O 1º de Maio - Dia do Trabalhador - é finalmente feriado. Prevê se uma manifestação, que de resto agora são livres (3)

(1)   - Dois deles eram o António Gervásio e o Diniz Miranda.
(2)   -  filme de Artur Semedo -  cujo verdadeiro título é “Burgueses, Malteses e às Vezes” 
( 3)– Em Évora, no ISESE, antes do 25 de Abril o ISESE encerrava no dia 1º de Maio – Dia de S. José Operário, cuja estátua, com esta etiqueta, estava no 1º lance das escadas do piso térreo para os superiores.


Viste o TV 7, ontem, domingo? É muito para um homem só ouvir finalmente, aquilo que alguns pensavam, muitos sentiam, mas não se podia dizer. E sobretudo o fim da guerra colonial, o direito à greve... Não, (...) não creio que se possa retroceder. A luta dos próximos tempos será de morte (não, não me refiro à guerra civil!); espero que o povo português não perca tudo o que pretenderão tirar-lhe: uma sociedade mais justa e humana. Mas de algo estou certo: "a longa noite do fascismo não voltará!".

Gostaria de estar contigo. Os dias que vivemos hoje são – para quantos de nós ?- a libertação do futuro, que talvez já não seja um beco escuro. Quero-te, mas isso que adianta se tudo [entre nós dois] continua como sempre [cada um para seu lado, longe um do outro] ?  (MCG - 1974.04.27/28)

A "Brigada de Saneamento" chegou ao Instituto: o Movimento foi crescendo e engrossando desde o 26 de Abril, em que a Direcção do ISESE tentou impedir a realização duma Reunião Geral de Alunos [RGA] e impôr uma Comissão Administrativa da AE do seu agrado. E desde 6ª feira passada, 3 Maio, o ISESE está em polvorosa e com reuniões de cursos para discussão e deliberações sobre cadeiras e professores que vão desde decisões de reorganização de programas, supressão de cadeiras, demissão de professores e abolição de aulas e exames. Entretanto os Jesuítas voltaram completamente a casaca e já aceitam diálogos e participações e até convocaram a Comunidade Académica (Professores, Alunos e Empregados) para uma reunião hoje à noite ! [7 de Maio] Comunidade Académica !!?? Como é possível mudarem.se as pessoas dum dia para o outro? Estou estupefacto! Enfim ... (1)

Tenho tido muito trabalho: durante todos estes dias e noites estive praticamente sózinho tentando levar a água ao moinho da unidade dos estudantes para a gestão do ISESE. A Direcção [do ISESE] tem sido completamente desautorizada e fazendo esforços para controlar a situação. A Comissão Organizadora [da AE] tem estado a estruturar-se especialmente desde ontem e é preciso agora organizar as comissões de trabalho para não serem torneadas pela Direcção [do ISESE] (2)

Amanhã vou até Lisboa; Não tenho notícias da minha mãe que penso irá para Luanda domingo próximo.

Telefonei-te domingo de manhã: estava muito cansado e gostava de ao menos ouvir-te. Mas o senhor Rodrigo disse-me que estavas doente. Com atraso aqui fica um beijinho para a Celestinha com amizade e ternura, pelo teu [23º] aniversário.

A máquina [de dactilografar da Associação dos Estudantes] está mesmo uma boa merda de ser manejada por quem não sabe. A Proclamação [dos Estudantes] foi enviada aos órgãos de informação e publicada nos jornais. (MCG - 1974.05.07)

1 –Os estudantes não participavam na gestão do ISESE; os jesuítas reservavam à Associação dos Estudantes papéis como a marcação dos exames e das frequências e realização da festa de finalistas, tolerando actividades desportivas, culturais bem como a publicação das sebentas e a gestão do bar até 1972. Em 26 de Abril de 1974 o então Director do ISESE, Pe. António da Silva sj, tentou impedir a realização dum plenário solicitado pelos estudantes proibindo a sua realização nas instalações do Instituto mas como este se realizou nas instalações da extinta Legião Portuguesa, tomadas de assalto pelo Movimento Democrático de Évora, recuaram e vieram com a Comunidade Académica a 7 de Maio. (...)


2 - A recusa da Direcção do ISESE em partilhar a sua gestão com os estudantes, pretendendo reservar a última palavra para a Companhia de Jesus, levou à radicalização do processo e à ocupação do Instituto pelo corpo discente. Contudo à medida que o tempo avançava os estudantes iam abandonando o processo e regressando a suas casas - a maioria não era de Évora, pelo que nas vésperas do Natal e Ano Novo não havia quem assegurasse a ocupação, pelo que fácil teria sido aos jesuítas reocuparem as instalações.

Penso contudo que o evoluir da situação política e a perda de controle final sobre a gestão e orientação ideológica do Instituto não era do seu agrado, pelo que assinaram um protocolo com o Governo visando a suspensão das actividades do ISESE e assegurando uma situação transitória para os que não tivessem terminado os cursos, mediante a criação pelo Governo duma escola de duração limitada no tempo - a Escola Superior de Estudos Económicos e Sociais Bento de Jesus Caraça - (re)criando-se depois a Universidade de Évora [que pertencera à Companhia de Jesus], extinta pelo Marquês de Pombal no século XVIII, embora gorando-se a expectativa dos Jesuítas retomarem o seu controle.

Os cursos do ISESE, permitidos graças ao contributo da Fundação Eugénio de Almeida e do Conde de Vilalva, dono de extensas propriedades agrícolas no Alentejo,  pretendiam  em Évora formar as elites que assegurassem a gestão da Administração Pública e das empresas, numa perspectiva económica e social., com base na Doutrina Social da Igreja. Economia era escolhido por filhos de gente como os Espírito Santo, Champalimaud e outros, enquanto Sociologia era frequentado essencialmente por ex-seminaristas e ambos por rapazes e raparigas cujos pais não tinham posses ou preferiam tê-las longe da "depravação" e agitação de Lisboa.

Em Sociologia poucos lá estavam por opção, como eu (...). Aliás, com defeitos embora, era o único curso de Sociologia em Portugal antes do 25 de Abril, já que o Governo de então considerava este ramo do conhecimento como sendo pouco aconselhável por potencialmente subversivo.

O autoritarismo e o autismo do Director do ISESE, (1) logo em 26 de Abril de 1974,  o desejo de deter o imparável  movimento em marcha, e os comunicados provocatórios que em seu nome assinou levaram à radicalização dos estudantes e ao quebrar de todas as tentativas de diálogo. Em Junho de 1974 a 2ª Comissão Coordenadora, de que também fizera parte [a 1ª demitira-se em RGA de meados do mês anterior]  apresentou a sua demissão em RGA elegendo-se uma 3ª de que não quis fazer parte, pois estava prestes a concluir o curso de Sociologia.  Continuando a participar na luta dos estudantes, estes mantiveram-me o mandato até Dezembro de 1974  para fazer a ligação da AE aos Partidos Políticos e representá-los, em conjunto  com outros estudantes,  nas Reuniões Inter-Associações de Estudantes e na Comissão Pró UNEP (União Nacional dos Estudantes Portugueses).

Até à suspensão das Actividades do ISESE decidida pela Companhia de Jesus no final de Dezembro de 1974 fiz parte da Comissão Directiva Paritária de Gestão do ISESE, como delegado dos Estudantes. Esta era constituída por igual número de representantes dos Corpos Discente e Docente, mas não era reconhecida pelos detentores do Alvará (a Companhia Portuguesa de Jesus), embora dela tivesse sempre feito parte o Secretário do ISESE, Pe. Augusto da Silva e o novo Director, o Pe. Vaz Pato, sj.

A ruptura definitiva deu-se após a  ocupação do ISESE pelos Estudantes  decidida por maioria em RGA, que determinou também que aquela Comissão Directiva Provisória ficava  sujeita às deliberações das RGA. 

(1) - E no entanto nas aulas de Antropologia Cultural e Antropologia Aplicada, o Pe. António da Silva sj era outro, com abertura de espírito e mostrando-nos que havia outros povos e outras culturas e outros sistemas de valores,  que deveríamos encarar com  tolerância e respeito pela diferença, sem etno-centrismos. Mas ao tentar querer parar com as mãos e controlar um imparável rio em marcha, com rigidez e autoritarismo, deitou tudo a perder.

~~~~~~~~

Os documentos dos estudantes entre abril e maio. [os alunos matriculados no ISESE em 1973/1974 não excediam as duas centenas]

1.

Aos 30 dias do mês de Abril de 1974, pelas 22 horas, os alunos do Instituto Superior Económico e Social de Évora (ISESE) reuniram-se em Reunião Geral de Alunos (RGA), na sede do M.D.E. [Movimento Democrático de Évora] para informalmente discutirem os objectivos a estudar ligados ao funcionamento interno daquela Escola, para posteriormente (6ª feira), em nova RGA, serem definidas as medidas a tomar para a sua imediata resolução.

Com a presença de 85 alunos começaram por ser justificadas as razões pelas quais a reunião não teve lugar nas instalações do próprio Instituto.

1º - A reunião é resultado da vontade de um grupo de alunos alheios à Comissão Coordenadora das Actividades da Associação dos Estudantes.
2º - Dada a hora (19:30) a que aquele grupo decidiu convocar a reunião não foi possível pedir a utilização das instalações do ISESE para a sua realização, uma vez que aquela Escola encerra às 18:30
3º - Aquele grupo optou, então, para a realização da reunião em instalações disponíveis.

Passou-se em seguida à definição daqueles objectivos o que deu origem a posições diversas entre os assistentes perante os problemas julgados cruciais.

Em seguida definiram-se seis pontos que constituem a ordem de trabalhos da próxima RGA.

1º - Pedido de responsabilidade à Direcção do ISESE sobre a política administrativa seguida até aqui.
2º - Formação de Comissões mistas, de professores e alunos, para a criação dos Estatutos do ISESE.
3º - Competência pedagógica dos professores.
4º - Discussão do programa das cadeiras dos cursos.
5º - Participação efectiva dos alunos no arranque da integração do ISESE no Instituto Universitário de Évora.
6º.- Representatividade da AE [Associação dos Estudantes]

Antes do encerramento da reunião procedeu-se à votação de três questões:

1º - Envio imediato de um telegrama de apoio ao Movimento das Forças Armadas, em que se apuraram os seguintes resultados:
- Não envio imediato.-  42 votos
- Envio imediato – 31 votos
- Abstenções – 12 

2º - Presença da Direcção do ISESE na próxima reunião
- SIM à presença da Direcção – 46 votos
- Não à presença da Direcção – 30 votos
- Abstenções – 9

3º Inclusão de um representante do 4º ano na Comissão Coordenadora das Actividades da AE.
Esta proposta foi aceite por unanimidade

Findas estas votações deu-se por encerrada a reunião quando eram 01:30 horas de hoje

Évora, 1 de Maio de 1974

A Comissão Coordenadora das Actividades da Associação dos Estudantes.


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Ao 1º dia do mês de Maio de 1974, pelas 16,35h, estudantes do ISESE, reunidos em Assembleia na sede do MDE  [Movimento Democrático de Évora], como anteriormente se verificara a 30 de Abril, para informalmente discutirem alguns objectivos ligados ao funcionamento interno daquele estabelecimento de ensino, a fim de em RGA [Reunião Geral de Alunos] a realizar 6ª feira, pelas 21:00 horas, serem definidas as medidas a tomar e a sua resolução imediata.

No início da reunião verificou-se a presença de 47 estudantes.

As razões que levaram aqueles estudantes a tal procedimento  foram justificadas pelo apoio ao 1º de Maio – DIA DO TRABALHADOR – e a  sua celebração festiva.

Mais se acrescenta que para além do momento histórico porque passamos a vontade dos estudantes foi aceite pela mesa informalmente constituída.

Foi então posta em causa a natureza da reunião, tendo-se decidido que a mesma não revestia qualquer aspecto de Reunião Geral de Alunos. Quaisquer decisões ali tomadas deveriam ficar sujeitas a posterior ractificação.

Foram apresentados os seguintes documentos:

Documento 1, apresentado pela mesa
Documento 2, apresentado por um aluno
Documento 3, apresentado por outro.

Todos os documentos são apresentados em anexo.

Sobre os dois últimos foi discutido se poderiam ou não ser considerados como aditamentos ao primeiro. Concluiu-se de imediato que todos eles deveriam ser considerados um só documento.

No prosseguimento da reunião foi nomeada e aceite por unanimidade uma Comissão Redactorial, composta por cinco elementos.

Até se pôr termo à reunião foram novamente invocados vários objectivos da anterior RGA, que ficaram em suspenso.

Dado o limitado número de estudantes presentes, às 19:45 horas, a Mesa deu por encerrada a Reunião.

Évora, 1 de Maio de 1974

A Comissão Coordenadora das Actividades da Associação dos Estudantes.

Documentos de trabalho para apresentação na RGA a realizar a 3 de Maio de 1974

DOCUMENTO Nº 1

Estudantes do ISESE reunidos a 1 de Maio de 1974, saúdam todos quantos, sobretudo na clandestinidade, têm lutado contra todas as formas de repressão e violação dos Direitos Humanos em sociedade, nomeadamente a partir da instalação da ditadura fascista.

Incluem nesta saudação o Movimento das Forças Armadas

Reivindicam:

A)    Participação dos Estudantes na Gestão Administrativa e pedagógica em igualdade de voto com os professores
B)    Declaram que aos empregados deve ser reconhecido o direito de participação e decisão nos assuntos que lhes digam respeito.
C)    O direito de livre reunião nas instalações do ISESE

DOCUMENTO 2

No caso concreto do ISESE o ensino deve ser dirigido no sentido em que os quadros formados a partir do referido Instituto se destinam exclusivamente aos interesses do POVO e não, como até aqui, no serviço dos grandes Monopólios Capitalistas

DOCUMENTO 3

Solicitamos a integração do ISESE no Ensino Oficial

Documentos elaborados e aprovados por estudantes reunidos em 1 de Maio de 1974


3.

Proclamação aprovada em RGA (Reunião Geral de Alunos)  de 3 de Maio de 1974

Os estudantes do Instituto Superior Económico e Social de Évora   reunidos em 3 de Maio de 1974, saúdam todos quantos, sobretudo na clandestinidade e  com risco da sua segurança e bem-estar, têm lutado contra todas as formas de repressão e violação dos Direitos Humanos em sociedade, nomeadamente a partir da instauração da ditadura fascista em Portugal.

Incluem nesta saudação o Movimento das Forças Armadas

Na sequência lógica das Declarações Universais dos Direitos Humanos e da Doutrina Social da Igreja;

Considerando os poderes discricionários da Direcção do ISESE, exclusivamente formada por membros da Companhia Portuguesa de Jesus e dela directa e exclusivamente dependentes,

REIVINDICAM

- o direito de participação na gestão do ISESE.

DECLARAM que o direito de participação na gestão do ISESE implica:

- o reconhecimento imediato dum Conselho de Estudantes (cuja constituição será objecto duma próxima RGA)
-  a liberdade de expressão do pensamento e na procura da verdade, o que implica a abolição do ensino dogmático e magistral;
- o reconhecimento imediato do direito de participação na constituição dos júris de exame;
- a liberdade de comparência às aulas, o que implica a abolição imediata do regime de faltas;
- a liberdade de reunião nas instalações do ISESE.

RECONHECEM aos empregados o direito de participação e decisão na resolução dos próprios assuntos.

SAÚDAM todos os professores do ISESE que de  forma inequívoca e expressa adiram ao conteúdo da presente Proclamação.

PROCLAMAM que prosseguirão na sua luta contra todos quantos, de qualquer modo, se oponham às declarações e reivindicações da presente Proclamação

Évora, 3 de Maio de 1974


_______________

DAS KAPITAL E O MANIFESTO COMUNISTA

Era um homem
Era um livro
-----bembelo
Era o livro com paredes de vidro
Era o Partido
Quando falavam ou agiam
--------não eram eles
--------era o Partido
--------contido!

Foram Marx e Engels
--------Estaline após Lenine
Era o tempo da revolta
----do fascismo e da guerra
Era o tempo da Revolução
----o tempo escasso
---------------de Abril em Maio
----o tempo da alegria e do sonho
---------------do mundo novo a construir.
A esperança era um canto na cidade aberta e
o futuro começava ali numa criança a sorrir
-----------ao virar da esquina
-----------ao alcance da nossa mão
O riso enchia a praça e tão leve o ar! ...

(...)

Até amanhã....... camarada...... ou não

Victor Nogueira Setúbal. 1989.03.21


RAIZES

(---)

De Angola
pouco sabíamos
até ao 4 de Fevereiro, até ao 15 de Março
Veio a guerra e
....................a mentira
que alimenta
..................a Guerra,
Veio a guerra e a violência
veio a guerra e a liberdade.

Em Évora a 11 de Novembro
Em Luanda a bandeira do meu país
no mastro subiu.
Era o tempo da liberdade e da esperança.

(...)

Victor Nogueira - Setúbal 1989

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. - Uma "manife" em Évora, num verão quente, nos idos de 1974


Ontem, no comício do PC, ali no Rossio de S.Brás, o Álvaro Cunhal falou na independência dos povos das colónias. (...) Ainda antes do Álvaro Cunhal falar o palco foi abaixo por duas vezes. Uma multidão imensa concentrava se em redor do palco, junto ao Monte Alentejano, agitando se inúmeras bandeiras vermelhas do PC. Em uníssono, a multidão repetia as palavras de ordem, de punho erguido.

Detecto, junto a mim, um grupo que vai comentando ao sabor das intervenções. Quando se falam nas torturas sofridas pelo Cunhal e outro comunista, uma mulher ao meu lado diz-me: "Coitadinho! Bandidos!" E a multidão grita: "Morte à PIDE!". Dois delegados dos Sindicatos Agrícolas (Évora e Beja) enumeram as quebras dos contratos colectivos de trabalho e o nome dos latifundiários. A multidão grita: "Morte aos cães!" "A terra a quem a trabalha!".
.
Ao meu lado, algumas mulheres dizem: "É assim mesmo!" e "Essa sou eu!", quando se fala em ranchos despedidos. O Álvaro Cunhal cita as lutas revolucionárias dos trabalhadores alentejanos e a "palha" que os latifundiários teriam mandado dar aos trabalhadores que imploravam comida. E a revolta; que enquanto houvesse ovelhas, galinhas e porcos não comiam palha os trabalhadores!

O Partido faz a sua campanha e no palco estão pessoas que já conheço de há muito. Por detrás delas, enormes, em fundo vermelho, as efígies de Marx, Engels e Lenine. A brancura de Évora é agora quebrada por cartazes do PC

Marx, Engels e Lenine enchem as ruas, conjuntamente com cartazes com a foice e o martelo. (MCG - 1974.07.28)

Gosto ·  · 

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