quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Encerrado ...

montagem a partir de foto de J. J. Castro Ferreira

Destaque duma foto de Rui Pedro

Fotógrafia destacada dum conjunto - Nogueira da Silva
(Lisboa - o regresso da família em 1975)

auto-retrato

Susana Silva (Mindelo)

Joana Princesa - musa de muita poesia sobre o amor e o brincar- tal como a Maria do Mar
(Porto)

Fátima P. (Buçaco)
a navegadora e anotadora nas nossas viagens em Portugal de lés a lés

Rui Pedro
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... por falta de leitores, de comentários, de nível ou de interesse. Ou tudo junto.
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Autores das fotografias creditados
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Retratos (28) - A teia que não enleia nem quer ou sabe prender

* Victor Nogueira (texto e fotografias)




Cela (Coutos de Alcobaça) ~Pôr do Sol na Herdade que foi do General Humberto Delgado
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Uma aranha para a posteridade? São tão giras, as aranhas, desde que não sejam daquelas venenosas, como se chamam, deixa lá pensar .. é isso: tarântulas. Em miúdo gostava de vê-las construir a teia, Era isso e as formigas em carreiro carregando com a boca alimentos maiores que elas, ali, todas em fileira, até ao montinho de areia que indicava a entrada do labirinto do formigueiro/casa. Já vi um por dentro, ao «natural», num museu, numa parede de vidro.
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E as lagartixas, que as agarrava na mão, fixando-nos mutuamente. Só os sapos é que era pior: estavam no jardim lá em casa, e a mão só se fechava para agarrá-los com uma esforço meu enorme, dada a viscosidade repelente da pele. E depois lá ficávamos a olhar um para o outro, ele de olhos enormes, esbugalhados, a garganta a inchar e a esvaziar como um fole, até eu o pousar suavemente no chão.
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Não me lembro se em Luanda havia andorinhas mas em Setúbal e Évora havia montes de ninhos nos beirais das casas, a Primavera cheia de aves esvoaçando e «cantando». Mas já não há andorinhas, nem aqui nem em Paço de Arcos. Ainda haverá andorinhas em Portugal?
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Vês, a maioria das pessoas não gostam deste tipo de comentários, mas sim que se diga «ai que giro», «mas que paciência tu tiveste», «quem me dera ser um insecto para ficar preso na tua teia, como Itaca por Ulisses». Não este último exemplo é infeliz, afasta logo as pessoas. Está provado que o Principezinho, a Raposinha, a Rosa e o Kant_O_XimPi e suas crias são incompatíveis e que o Mundo deste nem na imaginação existe, quanto mais na realidade. Na verdade as gaivotas em terra nunca se compadecem com tempestades, antes preferem águas mornas e meias tintas, em voos de pardal sem nada de águia altaneira.
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E no meio das núvens também não, que por lá já andei muitas vezes de avião: nada as distingue do espesso nevoeiro que por vezes encontramos na estrada ou à janela, como se de noite branca fosse mas nada nos deixa ver, como uma noite de breu em Lua Nova.
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e ouça aqui ,,, Zeca Afonso
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Setúbal ~~~ Pôr do Sol no Estuário do Rio Sado


Setúbal ~~ O homem da bicicleta, ao nascer do sol

E se quiser, passe por
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terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Em conversa com ... (10) TODO O MUNDO e NINGUÉM


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* Victor Nogueira
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À mana que nunca tive e gostaria de ter tido.
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À minha outra mana inventada, da Casa de Belmonte, sempre ocupada com o trabalho, mas sempre atenciosa e carinhosa e de quem gosto muito, muito, mesmo muito, que me pergunta sempre pelos sobrinhos e que aprecia imenso o meu filho Rui Pedro e cujos filhos me atendem sempre com simpatia ao telefone.
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Ao meu único irmão, de verdade, Zé Luís, morto de morte matada por ele próprio e por muitos outros no tempo que para ele terminou
naquela tarde de 26 de Fevereiro de 1987 ............................. )
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Ao meu irmão que adorava o mano, a cunhada e os sobrinhos.
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Ao meu irmão, que não morreu na Guerra Colonial, apesar de ter estado em zonas de combate como furriel miliciano enfermeiro, na nossa terra, Angola, incorporado obrigatoriamente e a lutar no Exército Português de ocupação contra os manos dele e meus, do MPLA ou não, e a tentar salvar a vida aos «camaradas» de armas ou vê-los regressar mortos, ensanguentados e desfeitos. Mas morreu depois, 13 anos depois, encerrado em si mesmo, sem concluir o curso de Medicina, por causa da guerra que o marcou para sempre. E que não continuou em Angola, apesar dos convites do MPLA, porque, após a independência do nosso País, de novo incorporado obrigatoriamente como cidadão angolano, veio para um país estrangeiro porque já lhe bastara o horror duma guerra. (1)
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Olá, mana
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Vês, como são as coisas. Tens belas fotografias e és mais viajada e cosmopolita do que eu.
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Há muito. muito tempo, perguntaste-me se te ensinaria a fazer um blog de fotos quando te dispusesses a isso.
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Como vês, não precisaste de mim, foste capaz de fazê-lo por ti.
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Só tenho pena que seja por este teu post que ocasionalmente saiba da concretização deste teu «sonho». Mas eu sou sempre o invisível e republicano.
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E parabéns duplos, mana. Pelo fotoblog e pelas fotos. Nestas és muito melhor que eu. Tal como o meu filho e teu sobrinho, que escreve muito melhor que eu e é melhor que eu em muitas outras coisas, salvo não ter bússola que lhe indique o caminho a seguir de vez.
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Para todo o mundo e ninguém,

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(1) - Luanda, 29 de Maio de 1951 - Paço de Arcos, 26 de Fevereiro de 1987 - O nome dele, como o de muitos outros que morreram depois de terminada a guerra mas por causa dela, não figura em nenhum monumento aos mortos em combate ! É um dos soldados desconhecidos, morto em vida, na terra de ninguém !

Postal (29) - Évora 1974 (4)

* Victor Nogueira
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Lisboa
74.12.02
MCG

Moura, rua típica

Querida C.


Não sei bem se isto que está em mim é "nervoso" ou ... gripe. Os dados estão lançados e vou para Évora dar aulas na Escola Industrial. O Dr.Pimentel queria que me apresentasse ao serviço já na 3ª feira, a mim convinha me na 4ª e acabou por ficar para 5ª! Vamos lá ver como isto corre. Hoje e amanhã tenho de preparar a lição. Ah!Ah!Ah! (isto é para disfarçar a morte que me vai na alma). Francamente, não me seduz ser professor de meninos! Mas ... podia ser pior! Olha, não sei onde ficarei em Évora - se calhar numa pensão - até ver! - pelo que me deves escrever para o APARTADO 65 - ÉVORA. OK?


Passei este fim de semana em casa do Luís Filipe [Vidigal Pereira] e da Isabel; são um casal um tanto ou quanto original. Não têm horas para nada!


(Não queres ir visitar me a Évora no próximo fim de semana? Ora, já sei que dizes que não!)


Saudades do VM


comboio para Évora
74.12.04
MCG

Coimbra,
Museu Machado de Castro e Sé Nova


Querida C.


Pouca terra, pouca terra, cá vai o comboio para Évora. Amanhã começa uma nova etapa da minha vida. Vamos lá ver como me saio desta! O José João trouxe-me esta tarde as fotografias, que não estão más. Gosto mesmo muito de algumas delas.


A propósito, também gosto deste postal, o último dos que comprei em Coimbra.


Despachei as malas - vêm no furgão, mas o saco com os livros pesa muito. Ali duas velhotas discutem as vantagens de ser criada de servir: ganham bem, vestem os vestidos da senhora, não gastam nada. Uma vida de fidalgas. Opiniões! Há pouco discutiam a nudez: passar aí um homem todo nú, que falta de moral e patati patata. Eu rio me a bandeiras despregadas e ela mete-se comigo. Bem, mas o espaço está no fim e eu fico me por aqui.


Um abraço amigo do VM


comboio para Évora
74.12.04
MEB

(flores)


Aqui vai um postalinho para ti; espero gostes do ramo de flores que te escolhi. Vou no comboio a caminho de Évora. Amanhã começo uma nova fase da minha vida. Vamos ver como corre.


Em tempos fui uns dias a Coimbra, assistir a um seminário [da Pro-UNEP] sobre a Democratização do Ensino. Passei por casa do casal Boaventura [em Coimbra], que enviam saudades. O mesmo faz o casal Armindo Gonçalves, em casa de quem estive [em Setúbal] um dia destes. Idem para a Maria Amélia, que encontrei em Évora um dia destes. Mas ... parece-me que já falei nisto no postal que enviei esta tarde!


Saudades e um beijo do VM


Paço de Arcos
74.12.04
NSF

Alcácer do Sal

Ora vivam, como vai isso? Estou de abalada para Évora. Imaginem logo o sítio onde acabei por arranjar emprego ... até ver! Convidaram-me para dar aulas de "Introdução à Política" na Escola Industrial e Comercial de Évora. Não me seduz mesmo nada ser professor e estou mesmo apreensivo e chateado. Tão farto que eu estou de Évora. Mas ... mal por mal devo ter umas 30 horas de aulas por semana e apenas duas lições para preparar semanalmente. Vamos ver como isto corre. O [Aníbal] Queiroga é que se lembrou de mim para este lugar; ele foi nomeado Presidente da Caixa de Previdência de Évora. Quanto ao Instituto, continua encerrado; vamos ver se o Ministro militar resolve definitivamente o assunto.


Encontrei a semana passada em Évora a dra.Maria Amélia. Deve ir para lá viver. A Noémia foi para Beja.


Bem, fico-me por aqui! Não querem cá vir passar o Natal ? Um abraço e saudades VM


Évora
74.12.09
MCG

Alentejo, paisagem ao anoitecer

Querida C.


Ufa, mas que fartura! Desde as 10 da manhã que estamos em reuniões na Escola, por causa do Decreto sobre a gestão democrática. Para além disso, como "falo demais", fui eleito delegado sindical. Safa! Entretanto o convite do Abílio [Fernandes] era para me tornar funcionário do MDP, uma espécie de "secretário-geral" em Évora. Mas ficou essa ideia suspensa, por enquanto. Enfim...


As fotografias já vieram e na maioria não ficaram más. Tu estás bem!


Não percebo muito bem como pode ser esta fotografia do Alentejo. Parece antes um campo alagado. Não sei se já te disse que a tal cave na Tapada ainda não está para alugar. Sempre é no tal largo onde estivemos.


Cá recebi o postalinho da Eva. Para todos envio um abraço, bem como a tua Mãe. Para ti beijinhos do VM


Évora
74.12.09
NSF

Lisboa, doca fluvial, ponte e Cristo Rei


Cá estou eu no 2º dia de aulas, que vão correndo. Não sei qual é a aceitação dos alunos. Ainda ando a fazer "experiências" para ver como hei de dar aulas. Estou hospedado na Pensão Giraldo, mas aquilo é só um remedeio, pois é muito caro. A velhota, empregada na recepção, tem perguntado sempre pela Mãe, a quem envia cumprimentos. O mesmo fazem o Queiroga e família.


Escrevo para dar notícias e também para pedir que me arranjarem uma certidão de nascimento para entregar na Escola Industrial. (Ah! Não sei se já vos disse que acabei em professor de Vida Política e [de] Introdução á Política) Tenho 28 horas semanais e os cursos gerais e complementares, com alunos e alunas dos 13 aos 27 anos (á noite). Enfim ...Não sei quanto vou receber ao fim do mês. Um abraço do VM


Évora
74.12.11
MCG

Vila do Conde, Pescadores de Caxinas


Querida C.


Como a maioria das minhas aulas é de tarde (até ás 18 horas) e como a última tiragem é a essa hora e como ando com o espírito pouco descansado, ... enfim, não me tem sido possível escrever-te com assiduidade. Este género de actividade [dar aulas] é para mim muito cansativo e não sei se será sempre assim. Ainda bem que estamos quase em férias. Depois ... está muito frio e nem imaginas o frigorífico que são a maioria das salas: um desconforto. E Évora é muito chata e um tipo não tem onde espairecer. Para além disso há em mim um certo descontentamento em mim, pois o meu lugar é em Angola e não nesta terra. 6 anos de exílio em Évora para cair cá mais um ano!


Tenho tido algumas aulas giras, mas noutras é uma frustração. Algumas são muito barulhentas (p'rá semana isto tem de mudar), outras são porreiras. Gosto mais de dar aulas aos gaiatos. Bem, cá te espero 6ª feira. Penso que virás por Montemor. Um abraço amigo do VM


Évora
74.12.16
MCG

(humorístico)


Olá, C.


Antão, que tal essa viagem? Encontrei há pouco o Pe.Vaz: os jesuítas já sabiam que eu sou professor. Estou aqui no restaurante da Rua do Raimundo: acabei de encomendar coelho com batatas. Daqui a uma hora começam as aulas: dormi mal - como sempre desde que sou professor - e sinto-me fatigado.


Fui hoje saber das casas, ambas as mais baratas já estão alugadas.


Acabou de chegar o almoço. Isto não é comida para uma pessoa de alimento como eu. Évora deve ser das cidades onde se come pior. Parece que os alentejanos jejuam por sistema. Arre!


Não me apetece escrever mais. Um abraço amigo do VM


Lisboa
74.12.30
MCG


Leiria, vista do claustro do castelo


Olá, C.


Há um ano e tal passámos nós por estas bandas ! (1) Por essa altura também o Kaúlza de Arriaga tentou demitir o Marcelo [Caetano], enquanto os capitães se iam reunindo. 4 meses depois seria o 25 de Abril - um dia de alegria no cinzento do quotidiano. Depois, a vida continuou e eu ... acabei como professor de Introdução à Política.


Está um dia cheio de sol. É bom para nós, citadinos. O mesmo não dirão os agricultores, desta falta de chuva.


Ontem fui ao cinema ver "Laranja Mecânica" [de Stanley Kubrick]. O supra sumo da violência , dizia a crítica. Da violência, tenho visto e sentido pior.


Telefonei-te hoje, mas não estavas.


Já estou em Lisboa. Vou cortar o cabelo e lá para as 19 h vou com o Luís Filipe [Vidigal Pereira] e a Isabel [namorada] ao cinema, ver "Chinatown" [de Polanski] A constipação não há meio de passar.


Cumprimentos aos teus. Para ti um abraço amigo do VM.

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1 - O meu pai veio a Portugal pela 1ª vez desde que partira para Angola em 1944/45, andando durante a breve estadia a rever Porto e arredores, comigo, a minha mãe e a Celeste. Na viagem [para o Porto] ficámos todos hospedados em Leiria, numa pensão e mo Porto numa estalagem.

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segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Postal (28) - Évora 1974 (3)


1974 - Campanhas de Alfabetização
(postal da Comissão Pró-UNEP)


* Victor Nogueira


Lisboa
74.11.06
MCG

Lisboa,
Mosteiro dos Jerónimos, Claustros

Olá, Celeste


Antão, como vai esse valor? Aqui dum café da Estefânea escrevo te mais umas linhas, antes de marchar para o Cais do Sodré, rumo a casa.

Com as acções do MR[PP] o CDS (1) conseguiou o acesso às câmaras de televisão, onde surgiu pela 1ª vez, com ar de "vítima" e moderador. O CDS que surgiu post-25 de Abril, que não esteve nas barricadas do 28 de Setembro,, conseguiu pôr os aprtidos todos a falar dele, censurando o assalto à sede. E que bem que o CDS se aproveitou da ocasião! O CDS da pretensa ala "progressista" do ... Marcelo [Caetano]. Mas .. o MFA (2) já foi di«zendo que as únicas interpretações progressistas do seu programa eram ... as socializantes. Beijinhos VM


Gostas do postal? As fotografias não estão más



Coimbra
74.11.13
MCG

Coimbra,
Palácio de Sobre-Ripas

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Olá, C.


São cerca de 18 horas e há 1 [uma] que terminou a sessão inaugural do Seminário Sobre a Democratização do Ensino. Estou aqui num café (O Mandarim), meu velho conhecido, com a malta de Évora. Está frio e ameaçando chuva. Ficámos num lar de estudantes, ao cimo duma ladeira imensa. Perante a enormidade do tempo à minha frente - só logo às 22 horas há uma sessão de cinema sobre a campanha de alfabetização. Sinto-me aborrecido. Tenho que arranjar com que ocupar o tempo. Amanhã quero ver se vou à matinée ver um filme "A Estratégia da Aranha" [de Bertolucci]. Procurei postais "decentes" em 2 papelarias e só encontrei este. Espero gostes. Eu gostei!


Ah! regressarei a Lisboa no próximo domingo. Bem, mas vou-me por a mexer aqui do café, que esta pachorrice já me está a chatear.

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Um abraço amigo e beijinhos do VM


Coimbra
74.11.16
MCG

Coimbra,
biblioteca da Universidade

Querida C.


Antão, como vai isso? e esse tempo por aí? Por cá chove e as ruas chegam a ser autênticos rios, que os carros chapinham encharcando os transeuntes descuidados. Aqui para os lados onde paro mais - Universidade, Cantina e Teatro Gil Vicente - predomina a malta nova e não se vêm táxis. Pouco tenho visto da cidade, que me parece desgraciosa; sem harmonia estética, ao contrário do que sucede em Lisboa ou mesmo Évora. Parece-me uma cidade incaracterística na traça dos seus edifícios e no delineado das suas ruas. Amanhã é o último dia do "Seminário Sobre a Democratização do Ensino", que hoje teve a presença do Ministro do Trabalho. Amanhã haverá um convívio. Sinto-me cansado: Saio de manhã e só volto à noite.


De boatos nada tenho ouvido, mas pelos jornais tenho sabido que se preparará nova intentona reaccionária; os tumultos em Angola seriam o prenúncio. Será desta vez a guerra civil - lá e cá? Um abraço amigo do VM

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74.11.17
MCG

(político)
A unidade estudantil com o povo trabalhador - COMISSÃO PRÓ-UNEP


Olá, C.


Cá vou de regresso a Lisboa, num comboio cheio mas onde consegui arranjar um lugar sentado Os meus companheiros de cabine dormem e um deles ressona beatificamente.


Este postal é - creio - uma fotografia retirada dum dos dois filmes que há dias vi sobre as campanhas de alfabetização, as tais em que eu gostaria de ter participado em Agosto último se ... Esta cena do filme era comovente: uma mulher que até aí não sabia comunicar por escrito, conseguir fazê-lo. A procura das sílabas, o gesto hesitante, o voltar atrás para corrigir ou desenhar melhor a letra !!! Deve ser bestial um tipo descobrir que sabe ler, não achas? Beijinhos VM


Arouca (Monte da)
74.11.24
NSF

(humorístico)
Uniformes Europeus

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Estamos a meio da tarde de domingo, aqui no Monte de AROUCA onde a Celeste dá aulas, uma herdade enorme que quase parece uma aldeia, agora abandonada (quase) pela crise da agricultura e da política dos agrários. O monte fica junto ao rio Sado, a 10 km ao sul de Alcácer do Sal e a 2 horas de camioneta de Lisboa. No meu colo está a minha amiga Eva, filha duma trabalhadora [Aciolinda], e que tem 3 anos. Uma "mulherinha", como me diz. A Mãe dela aquece-se ali ao lume, enquanto a Celeste lê e a Mãe arranja as azeitonas que colheu ontem á tarde.


Então, como vai isso por aí? Mais sossegado? Por cá as coisas vão andando,. Ainda não arranjei emprego, mas espero consegui-lo até ao fim do mês.


Tenho recebido os recortes dos jornais. Gostaria de receber "O Angolense" Pode ser? Um abraço amigo do VM e outro da Celeste.


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domingo, 24 de fevereiro de 2008

Postal (27) - Évora 1974 (2)

* Victor Nogueira
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Porto
74.04.11
MCG

(humorístico) menino com um ramo de flores

Olá, C.


(Sabes, não estou contente pela nossa ausência um do outro) Bem, este postal já começou a ser escrito há muito. Depois .... ficou arrumado a um canto. Já estou no Porto. Jantei em casa do avô Barroso e daqui a pouco vou para casa do avô Luís. A viagem foi boa, embora tenha chovido a meio do caminho. A paisagem é simplesmente maravilhosa - tão verdejante! Gostaria de viver por estas bandas. E tu? Gostaria de ver contigo estas paisagens! Sábado deves escrever me para Lisboa e 2ª para Évora. OK? O tio Zé, a 1ª pergunta que me fez foi "Então a tua mulher, onde está?" Ah! Ah! Ah! Um abraço do VM


Não há nenhum filme de jeito aqui no Porto. Safa!


Paço de Arcos
74.09.18
MCG

(flores)

Olá, Celestinha


Está quase na hora da tiragem do correio aqui em Paço de Arcos de modo que passei ali pela tabacaria e escolhi este postal para te escrever. Está frio e encontro-me sentado num marco de pedra no passeio, onde está o mercado defronte ao correio.


Isto é uma simples descrição do sítio onde me encontro. As pessoas, os carros passam de regresso a casa e eu quero ver se ainda passo ali pelo "super"mercado.


Aqui te deixo beijinhos e ternurinha (enregelada, Ah! Ah! Ah!) do VM


Recebi hoje 2 cartas tuas - de 16 e de 17. XX


Lisboa
74.10.22
MCG

Leiria, vista do castelo

Olá, "Celestinha das ternurinhas "


Desta vez escrevo do Café Gelo, aqui no Rossio, avistando ali uma nesga da Rua 1º de Dezembro e da Estação [do Rossio]. Defronte a mim o [Emídio] Guerreiro acabou de lanchar e lê agora o jornal. Mais adiante, o empregado da tabacaria, calças aos quadrados., camisola preta e longos cabelos louros, vai lanchando e arrumando a loja. Esperamos que o Carlos [Nunes da Ponte] saia do emprego. O Guerreiro chegou ontem e temos percorrido Lisboa em busca dum emprego que não aparece, apesar do coração de Portugal estar doente e ser uma chatice se deixar de trabalhar (Pelo menos é o que diz o anúncio da RTP). Assim, temos deixado impressos devidamente preenchidos ... aguardando. As minhas tias, especialmente Esperança, andam inquietas, pois dizem que eu sou bolchevista (ai, credo!) e assustam-se quando digo que vou começar a assaltar bancos. Acabou-se o espaço. Amanhã há mais.


Beijinhos do VM


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74.10.28
MCG


Alcácer do Sal

Celestinha


A camioneta vai daqui a pouco para Montemor. Está sol e daqui te envio saudades. Já engraxei os sapatos e estou mais apresentável. Gosto de ti, por quem hoje estou com vontade de ternurinhas. Mas não pode ser! Assim, um abraço amigo do VM

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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Postal (26) - Évora 1974 (1)

* Victor Nogueira
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Cascais / Lisboa---
74.01.02
MCG (?)

Cascais, Boca do Inferno

Uns largos minutos depois das linhas anteriores. Estamos aqui no Hotel de Santo Amaro. O meu pai acabou de dar cabo dum pacote de amendoins que comprou na Boca do Inferno (na foto muito apaziguado). O céu está cinzento de chumbo e o motel está quase vazio. Além uma senhora faz crochet e, lá fora, o mar morre serenamente nas rochas. Eu vou interromper. Termino em Lisboa. Já estou novamente na pensão. Lá no motel ainda joguei nas máquinas; também 3 desafios de futebol, com o meu pai, tendo ganho dois. Estou muito cansado e sinto-me triste. Não me apetece ir para Évora nem gosto de Lisboa, assim.


Beijinhos VM


Évora
74.01.03
MCG

(humorístico)

Querida C.


O quarto está gelado. Passei o fim de semana lendo umas coisas de antropologia. Tenho os "conhecimentos" um tanto ou quanto baralhados. A D.Vitória [hospedeira] veio aqui há pouco trazer-me um doce e pêras de arroz doce. Está uma simpatia de senhora!


E o teu fim de semana, como correu? Ontem ás 13 h, quando ia para o Liceu almoçar, resolvi passar pelo Gião (Restaurante) e encontrei-me com a Ana á esquina. Foi-se a última hipótese de ir até aí, pois ela tinha frequência (exame) á tarde, ficando cá o fim de semana por causa do exame de Matemática.


E então, que me dizes ao aumento do preço do petróleo e seus derivados? (Lá para Abril deve haver mais. Olarilas!). A velhota dos jornais ali ás portas do Arcada já desabafou comigo esta manhã: não haver um raio que os partisse! Há 10 dias encomendara uma garrafa de gás; está cozinhando a lenha. Que só na 3ª feira. "Os patifes, os espertalhões, já sabiam disto e obrigam-me a pagar o gás mais caro!" Como dizia o [Luís] Carmelo, muito solene e sisudo na sua pose á mesa do café: "Isto está cada vez pior!"


Beijinhos do VM


Évora
74.01.04
MCG

Matosinhos, porto de abrigo

O computador cerebral está programado para Antropologia. São 20h 40 e tenho de ir jantar. Antes, uma visitinha para saber de ti.


Mais um postal para a colecção. Não chegámos a ir lá porque havia a grade no meio da muralha, lembras te?


Olha, se eu soubesse que tencionavas ir ao Monte tinha desistido mais cedo do fim de semana. Não sabia se tinha tudo OK para poder ir e não queria comprometer me com o Chico ou [com] a Ana, sem a certeza de ir. Afinal a Ana não foi e o Chico não tinha lugar. Enfim, um beijinho e cara alegre. Um abraço do VM


A tua prima [Emília] escreveu me para agradecer as BOAS FESTAS.


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74.01.08
MCG

(humorístico)

RETRATO DE SENHORA PENSANDO SE HÁ-DE ACEITAR UM CONVITE PARA UMA IDA AO FIM DO MUNDO (ou já terá aceitado e pensa na data do embarque?) ENQUANTO NÃO SE DECIDE SE HÁ-DE ACEITAR: "viaje agora e pague depois" (ERA BOM, NÃO ERA? EU GOSTAVA, E TU ?), AQUI FICAM MAIS BEIJINHOS DO VM


Évora
74.01.14
MCG

Évora, Travessa da Caraça

DEPOIS DA FEIRA


Vão vagos pela estrada,
Cantando sem razão
A última esp'rança dada
Á última ilusão.
Não significam nada
Mimos e bobos são.


Vão juntos e diversos
Sob um luar de ver,
Em que sonhos imersos
Não saberão dizer,
E cantam aqueles versos
Que lembram sem querer.


Pajens de um morto mito,
Tão líricos, tão sós !
Não têm na voz um grito,
Mal têm a própria voz;
E ignora-os o infinito
Que nos ignora a nós.


Fernando Pessoa


Olá, amiga.


Notei apenas que a despedida foi um aperto de mão e tu no passeio enquanto me afastava. Há "coisas" que me ultrapassam, sinceramente! NÃO QUERO mais apertos de mão no futuro.

xxx do VM


Évora
74.01.15
MCG

Évora, Praça do Giraldo e Montepio Geral

Pela fotografia não parece mas hoje é mesmo dia de S.Porco, i.e., 3ª feira (1). Já viste como seria pouco agradável o Giraldo ... se cheio daqueles chaparros "cinzentos como cepos sem vida" ? Estou aqui no café aguardando a sobremesa; o "rancho" melhorou um pouco, depois da saída do Aguilar e do Moura neste fim de semana. Vamos ver quando chegará a minha vez.


Amanhã de manhã vamos à [fábrica da ] Siemens tratar das "massas" e saber de trabalho. Recebi hoje uma visita do Carlos [Nunes da Ponte]. 'Tadinho, está mesmo a fazer um trabalho de escravo, sem promessa de remuneração.


Antão, a "pestezinha" (2) sempre levou a dele avante e foi até à Tele-Escola ? Ele sabe-a toda. Olarilas! Um "bacalhau" para ele. Saudações a tua Mãe. Saudades minhas. Para ti beijinhos do VM


Évora
74.01.16
MCG

Porto, Ponte da Arrábida

Querida C.


O postal está um pouco enxovalhado, mas aqui na tabacaria da esquina não há (quase) nada de jeito. A manhã hoje estava frigidíssima (passe a força de expressão) e agora á noite está húmido. Um princípio de resfriado está me entrando no corpo, consequência talvez da frialdade da sala da Câmara onde temos estado a trabalhar. Não sabia que havia tantos emigrantes eborenses para a Suiça! A minha Mãe chegou hoje; as fotografias (algumas das) estão boas. Saudações da m/ Mãe. Para ti um beijinho do VM


Évora
74.01.18
MCG

(humorístico)

Olá, C.


A tua carta recebida ontem traz em si [...]

Isto foi um postal nunca enviado, apesar de começado (há muito tempo atrás) Mas o postal da Rua da Abadia que vai junto não é alegre, mas mesmo que eu esteja triste ou aborrecido, não gosto de tragédias.


Queria pois enviar-te um postal bonito, mas este foi o único que encontrei ali na gaveta. Aqui fica com um beijinho do VM


Évora
74.01.18
MCG

Évora,
rua típica


De Évora, esta rua (da Abadia) é um símbolo. São quase 20 h e em mim uma grande má disposição. Do trabalho que neste momento estamos fazendo, um grande enfado e contrariedade. Aquilo é mesmo de enlouquecer. Ah! mas isto não pode continuar assim! Nunca pensei em tal monotonia; é quase como estar dias inteiros apertando a mesma porca numa linha de montagem numa fábrica de automóveis.


A minha Mãe lê ali uma revista. Já houve tempestade. Sempre a mesma moínha por causa da [minha tia] Maria Luísa. Safa! A tua saúde como vai? Queria estar contigo, mas não tenho já alegria e entusiasmo nenhuns nas minhas idas à Amareleja. Estou uma tal pilha de nervos que os meus sentimentos estão bloqueados.


Se o médico diz que tens isso, porque hás-de pensar em tragédias?


Saudações do VM


Évora
74.01.18
MCG

Évora, Praça do Giraldo e Igreja de Santo Antão

A fotografia é antiga! Não parece ! Mas ... a cerca da fonte já não é assim e o táxi (1º) já não existe. Também as motorizadas já não param no topo do tabuleiro. A indumentária das pessoas e a esplanada defronte do "Diana" indicam que é Verão ! Eis aqui a célebre Praça do Giraldo, o local que os meus pés mais têm calcorreado. É sábado e estou jantando. Este fim-de-semana foi um pouco "chocho". A semana passada houve uma boa peça de teatro (O Amigo do Povo) e um filme a ver (O Espantalho). Esta semana, nada. Enfim. Por mero acaso integrámo-nos numa das visitas guiadas do Túlio Espanca. Mais duas igrejas visitadas. Amanhã é domingo (já é ontem, não?). Vê lá como o tempo passa e as coisas acontecem.


Beijinhos do VM


Évora
74.01.21
MCG

Évora, Praça do Giraldo

POENTE


No postigo do monte
inquieto rosto acode
espreitando para longe
o descampado aberto.


(Quem vem lá na distância,
Que nem a seara mexe
nem o pó se levanta
dos caminhos sem vento ? ...)


Manuel da Fonseca


É ao anoitecer. Ouço uma sessão de órgão que o Carlos [Nunes da Ponte] gravou para mim vai para uns 2 anos. Os óculos encavalitados no nariz, a minha Mãe vai lendo um trabalho meu sobre "A ocupação portuguesa de Angola"


Este é mais um postal para o álbum. Beijinhos do VM


É uma fotografia bonita, não é ?!


Évora
74.01.24
MCG

Évora, Sé Catedral

Querida amiga


Com este se terminam os postais de "jeito" que tinha para enviar-te, aqui em cima da mesa, cuja papelada e livralhada acabei de arrumar, para ganhar um pouco de campo para estudar. Preciso de arranjar mais um ou dois caixotes para arrumar a tralha.


Perguntas-me quem é a "pequenitates" ? É uma miúda baixinha, que "mora" ali no quarto que foi teu e da Bia [Almeida]. Não sei o nome dela! A minha Mãe já recebeu as fotografias da viagem pelo Norte, no mês passado. Ainda não as vi. Já te expliquei que não precisas de devolver a revista. Mas por força hás de fazer a tua. Não te esqueças das fotografias da revista que tens na Escola.


Abraços do VM


Évora
74.01.28
MCG

(profissões)
Mestre escola (nº 2)

Olá, C.


O soalho está molhado. Lá fora chove, um homem, eufórico, está com uma conversa parva ali ao telefone (deve ser com uma rapariga). O Luís entra e cumprimenta-me. Escrevo nos joelhos, aqui na tabacaria da esquina, pois a escrivaninha está ocupada. Acabei de jantar no Arcada com o João Luís e a Filomena. Detesto comer naquela cave abominável, sem janelas. Também estou farto de gabardinas e casacos, que prendem os movimentos. O último "Observador" traz o texto duma conferência do Armando Nogueira em Viena. A minha Mãe escreveu e manda saudades. Voltará do Porto lá para 11 Fev.


Beijinhos VM

Évora
74.01.29
MCG

(paisagem)
Porto de embarcações ao poente (ou nascente?)

Querida C.


Isto dum tipo tomar banho com cheirinho a peixe ....


Bem. tenho de mudar de caneta, pois a outra já me começava a sujar o indicador direito. No gira-discos o José Afonso canta agora um poema do Luís de Camões. O [José Emídio] Guerreiro está ali vendo postais. Daqui a pouco vou jantar. Deixei de jantar lá em baixo. Amanhã devemos acabar o trabalho na Caixa de Previdência. Entretanto no próximo dia 15 de Fevereiro haverá eleições na Associação de Estudantes. Convidaram-me para Presidente da Mesa da Assembleia Geral. Quero ver se hoje consigo pôr a correspondência em dia. Amanhã devo ir até ao Liceu; vamos lá ver que tal a comida. Beijinhos do VM


Évora
74.01.30
MCG

(humorístico)

Olá, C.


SAFA! Estou mesmo saturado. Horas, desde há dias, passando apontamentos. A manhã de hoje quase toda de pé, na Caixa. Frio e chuva autenticamente invernais. As botas encharcadas. Procurei um postal "decente" mas este foi o melhor que se arranjou. Volto o postal e reparo que ... a miúda está de sombrinha. Mas não deve ser ... inverno. Fui hoje ao Liceu. Amanhã estreio as refeições na cantina do dito. Vamos ver que tal a comida. Apetecia-me hoje ir a casa de alguém, com uma poltrona confortável, ouvir música e conversar. Talvez telefone ao Carlos. A partir de 6ª feira os jornais diários passam a custar 2$50. Tudo aumenta, minha gente.


Junto te envio um recorte do Urbano [Tavares Rodrigues] no [Diário de] "Lisboa" de hoje. Bem, vou jantar que o espaço acabou. Beijinhos do VM


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74.01.31
MCG

Imbondeiro, ao pôr do sol (?)

O imbondeiro é o símbolo de Angola, pretendem alguns. Também o pôr do sol nos trópicos é algo de maravilhoso. E então para quem morava à beira-mar!


O Carlos [Nunes da Ponte?] acabou de sair. Esteve aqui no paleio. Está frio; o quarto é grande demais para os 750 W do aquecedor. Ando num estado de tensão quase insuportável. Ainda não falei nem com o [Chico] Lucas nem com a Ana. Preciso simultaneamente de descontrair e de estudar. Sobretudo de descontrair. Precisava de um carro para sair de Évora, sem sujeições aos outros ou às camionetas.


Fui ao Liceu falar com o reitor para poder almoçar na cantina. Comi lá hoje pela 1ª vez: foi saboroso. Custa 7 $ 50 a refeição. Não há jantares. Não deverei aceitar a Presidência da Mesa da Assembleia Geral [da Associação de Estudantes]Poderei trabalhar se for caso disso, mas sem cargos. Não sei se irei à Amareleja. Logo se verá. Beijinhos do VM


Évora
74.02.07
MCG

Barcelos, Mercado de louça

Querida C.


Estou aqui no Arcada. Na mesa ao lado o João, a Filomena e companhia folheiam e comentam uma revista brasileira. Vim há pouco de casa do Xico, que não volta aí senão pelo Carnaval. Quanto à Ana, ainda não sabe se vai. Estou chateado. Primeiro porque cada vez gosto menos das pessoas da Amareleja e daí. Para além do provincianismo, o sentir-me estranho. E depois também me começa a chatear o sistema das boleias e ficar em casa do sr. Cachopo. Enfim, ... isto está mau. Não fosses tu e facilmente iria tomar ares para bandas onde não me sentisse tão deslocado.


Por causa do nosso trabalho fomos hoje falar com as big bosses do Liceu e Escolas. Também ao Magistério, cujo director teve uma saída ... que muito dificilmente consegui suster o riso. Depois te conto.


Sinto-me cansado e, porque não dizê-lo ... não interessa escrever-te "desamparado". Tudo isto vai de mal a pior. E parece-me que estamos longe um do outro. VM


Évora
74.02.18
MCG

(humorístico)
menino piscando um olho, com latas velhas em redor

Ora viva, então como vai essa cabecinha destemperada? Fiquei verdadeiramente surpreendido com o teu despropósito. Mas que teve o mérito de mostrar quantos confusionismos tens a meu respeito!


Voltaremos á tua carta de hoje. Não agora; mas precisamos mesmo de conversar. Hoje, nada mais tenho para dizer-te. Um abraço VM


Viana do Castelo
74.03.30
MCG

Viana do Castelo, Praça da República

Ora viva, C.


Está uma tarde maravilhosa aqui em Viana, onde viemos almoçar neste domingo de Páscoa. Estamos a dar uma volta, visitando a cidade; vou escrevendo enquanto vou andando. Interrompi para tirar umas fotografias no largo deste postal, mas não encontrei nenhum ângulo que me agradasse. O José João tirou fotografias e o resto da família conversa. Bem, fico me por aqui. Um abraço amigo do VM


A Teresa manda muitos beijinhos e a Isabel manda cumprimentos e o Carlos beijinhos e abraços.

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1 - Ás 3.as feiras a Praça do Giraldo e o Café Arcada eram tomados de assalto pelos agrários, para o mercado semanal de gado. Um poema meu, "Natureza Morta", refere-se a este facto.

2 - É o sobrinho Zé Manel Gato.

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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Postal (25) - Évora 1973 (4)

* Victor Nogueira
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Paço de Arcos
73.10.02
MCG

Ericeira,
Praia do Norte

Querida C.


Defronte a mim o Tejo refulge como um espelho. Passa uma fragata e há barcos ancorados. O ferry boat prepara-se para acostar. Passam pessoas ali em baixo na rua e as gaivotas evolucionam sobre o rio. Estou no 2º piso dum autocarro, aguardando que ele parta. Começou a andar. Até já.

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Afinal já se passaram 24 horas sobre as linhas anteriores. Almocei com a Emília [Dias], que está gira com o cabelo curto e gentil. O almoço, na "Isaura", ali na Av.de Paris, estava bom e falámos dos nossos velhos companheiros de lides associativas [estudantis] - quantos já se integraram no sistema ? Outros continuam a lutar, alguns à custa da própria liberdade. Logo após o almoço irei para Évora. A minha Mãe aproveita para passear e leva me.


A campanha eleitoral começou ontem. No círculo de Beja apenas há a lista do Governo [ANP - Acção Nacional Popular] Junto te envio dois editoriais do República.


Beijos e abraços do VM


Agradeço-te que não deites fora a papelada que te vou enviando.


Évora
73.10.09
MCG

Porto, Igreja dos Clérigos

XE "Porto: Igreja dos Clérigos"§Querida C.


São umas 21 horas e daqui te envio um aceno amigo. Daqui da tabacaria da esquina, cheia de gente que aguarda ligações telefónicas. Estou com um princípio de valentíssima constipação. Acabei há pouco de jantar - uma porcaria! - e daqui a pouco vou até casa para terminar o trabalho de Doutrinas Sociais, cuja 2ª parte está fraquinha e desconexa da 1ª. Tenho de refundir uma ou 2 páginas.


Gostava de ter falado contigo hoje. Tenho saudades tuas - muitas. Beijos e abraços VM


Escreves me?


Évora
73.10.30
MCG

Arraiolos,
o Castelo

Querida C.


Um castelo circular é, para mim, surpreendente. Imagino-os em linha quebrada, poligonais. Bem, mas de Arraiolos foi o postal mais jeitoso que encontrei. Escrevo-te aqui nos "Manuéis" [Restaurante na R. Raimundo] enquanto espero o peixe grelhado. Vamos lá ver que tal o GORAZ. Em frente a mim o [Luís] Carmelo aguarda também o seu almoço. O dia está chuvinhante. Vou para Lisboa daqui a pouco no comboio das 14.45. Cerca das 18 lá estarei. O entusiasmo não é grande, pois tenho presente o sossego que não tenho. Estarei de volta 5ª feira. VM


Lisboa
73.10.73
MCG

Viseu, Sé e Museu Grã Vasco

A princípio pensei que fosse a Sé do Porto, mas não! Escrevo-te no antigo laboratório da Farmácia [Sanitas, no Largo Luís de Camões], no tempo em que as mezinhas eram manipuladas aqui nas traseiras. São cerca de 17:00 e os empregados tomam cházinho com bolos. O tempo por cá é muito mais ameno que por essas bandas. Ah! o cházinho é porque a minha tia Esperança faz ... 71 anos. Tenho andado sem sentido, dum lado para outro. Comprei uma gabardina e uns livritos, bem como uns cabides para pôr toalhas no quarto de banho (Vamos ver se são funcionais) Também comprei uns livritos, mas não encontrei o que procurava: "Antropologia Aplicada".

Bem, vou pregar a outra freguesia. Dá por mim saudações a tua Mãe. Para ti beijinhos do VM


Setúbal
73.11.01
MCG

Setúbal, Praça do Bocage

Daqui da esplanada do café, olhando á minha direita, a paisagem é esta. Olha lá, e se a gente viesse viver para Setúbal? É mais sossegada que Lisboa e é uma hora de camioneta! A tarde está chuvosa, o café está cheio de gente, rapazes e raparigas, e a passarada faz uma chilreada enorme por entre as árvores. A minha Mãe trouxe me até aqui , onde ás 18 horas apanharei a camioneta para Évora. Conheci hoje uma senhora com 65 anos mas toda cheia de genica e desassombro, como não há muitas mulheres em Portugal. (que eu conheça!). Olarilas. Antão, que tal esse Dia de Todos os Santos? A minha Mãe manda te muitos beijinhos. Abraços do VM


Évora
73.11.07
MCG

Arraiolos,
Pelourinho, vista geral e o Castelo

Querida C.


De Arraiolos, 3 vistas em 1. Vim de lá há pouco, em mais uma missão que oficialmente é de inquiridor do Ministério das Corporações e particularmente é o modo de cuidar de mim, i.e., de arranjar massas.


Fui hoje ao Castelo, pela 2ª vez, que mais parece o redondel duma praça de touros. Para além disto estivemos na Casa do Povo e na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo.


Começaram hoje as aulas de "Estudos da População ". O [Pe.Augusto Silva] limita-se praticamente a ler as folhas. Cada vez suporto menos os jesuítas.


Bem, a hora do jantar "aprochega-se" Beijinhos do VM


Lisboa
73.11.21
MCG

Lisboa, miradouro de Sta. Luzia

Neste passeio por Lisboa, vindos do Castelo de S.Jorge para o Rossio, nada como uma paragem para ver Alfama, mais aquela senhora lá em baixo, de janela escancarada, indiferente ao devassar da sua intimidade. Como te disse fui ontem a casa do Armando Nogueira, por causa do trabalho de Doutrinas Sociais. Ele tem uma casa muito bonita. Está doente há uns quinze dias. Tivemos uma amena conversa, mas saí de lá "doente". Tenho andado bastante deprimido e custa-me a suportar a ideia de que não é tão cedo que me livro do Instituto e dos jesuítas.


Por hoje é tudo. Beijos e abraços do VM