segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Sobre a nacionalização da banca


Fala Ferreira

Assim me saúdam os amigos de Guatemala.

Exigimos a nacionalização da banca!

Os meus últimos textos aqui têm esbarrado num ponto. Eles parte de uma premissa estratégica distinta da esquerda portuguesa, plasmada nas suas palavras de ordem. Os partidos de esquerda enfermam de patriotismo e, consequentemente, colocam o problema errado. O debate negociação vs repúdio da dívida coloca a nação à frente da classe. Consequentemente, a estratégia toma um ponto de vista burguês – pois só a classe dominante ou em vias de dominar fala em nome da nação. Ou, pelo menos, a estratégia não está colocada do ponto de vista da classe operária. A provar isto está o facto de que a tática (a greve geral que se aproxima) não se desdobra da estratégia.
Por isso vou propor outra estratégia, orientada pela palavra de ordem: Exigimos a nacionalização da banca!
1. Tenho vindo a afirmar que a classe burguesa se divide entre o setor financeiro e os outros, com algumas nuances. A crise em torno da TSU provou, mais uma vez, essa tensão. Historicamente, foi a banca, junto com a construção civil, que conduziu os destinos de Portugal. E, depois de uma breve interrupção, na qual perdeu o seu parceiro, está de novo no governo. Portanto, a única forma de mudar qualquer coisa é suprimir economicamente, nacionalizando, este setor.
Além do mais, a classe trabalhadora está igualmente dividida em duas frações. Os trabalhadores do setor público e os trabalhadores do setor privado. Simplificando muito, os primeiros lutam contra o capital e os segundo contra o Estado corrupto. Consequentemente, a luta dos segundos é, em parte, contra os primeiros. Demonstrar que a corrupção se concentrou especialmente nas negociatas entre Estado, banca e construção civil é o caminho para unir as duas lutas. Mais uma vez, a palavra de ordem ‘Exigimos a nacionalização da banca’ estabelece uma estratégia mais pertinente que as palavras de ordem atuais.
2. Assim pensa um marxista. Mas não é assim que pensa o cidadão comum. O cidadão comum vê as coisas em termos de legitimidade sob a perspetiva da nação. De qualquer modo, um curto inventário dos factos da história económica recente demonstrará a justiça desta reivindicação. Perdões fiscais, PPPs e, mais recentemente, juros da dívida pública, e com a troika, o Fundo de Recapitalização mostram que a banca engordou com dinheiro públicos. Os lucros da banca são dinheiro de impostos. Por isso não é uma nacionalização do património privado (da banca), senão reverter 25 anos de privatização do património público.
Além do mais, essa parece ser a solução para a crise. Ou, pelo menos, foi assim que a Islândia a solucionou. Depois de deixar falir a banca falida, nacionalizou o resto e agora quer inscrever na Constituição que a banca deve ser pública e não privada.
3. Tendo em conta a presença bastante grande da base do PS e do BE nos movimentos de massas em geral e na CGTP em particular, não estou a propor que o PCP (e o PCTP) se isolem? Não. Até porque é errado tática, teórica e politicamente que o PCP tenha a mesma estratégia que a CGTP. Primeiro, essa coincidência mostra uma de duas coisas: ou o PCP recua ao ponto de acompanhar aqueles com quem luta no movimento unitário; ou aqueles que não militam no PCP não têm voz na CGTP. Segundo, a passagem das lutas setoriais (sindicais) às lutas globais (partidárias) representa um passo no amadurecimento das condições subjetivas. Se as estratégias coincidem, esse passo, tão caro a Lénin, desaparece. Terceiro, que decorre do anterior, a diferença entre as estratégias dos sindicatos e do partido deve definir o caminho da revolução do mesmo modo que dois pontos definem uma reta. Quando os pontos coincidem a reta e o caminho da revolução permanecem indefinidos.
O mesmo se aplica a coordenação entre o partido revolucionário e as frentes de massa onde atua.

2 Comentários »

  1. Parece-me que nesta fase exigir a nacionalização da banca é extemporânea. Teríamos novos BPN ? E os banqueiros não estão afins ! Já se pronunciaram em tempos pelo Não !
    Primeiro é preciso que o Governo a formar não seja o dos grandes grupos económicos e financeiros e que tenha força para se lhes opôr ! Doutro modo é pôr a carroça a andar à frente dos bois !
    Comentário por kantoximpi | 21 de Outubro de 2012 | Comentar
    • Victor
      Pagaremos de qualquer modo. Contas de merceeiro me levam a crer que 13% dos nossos imposto estão a servir para pagar juros da dívida pública… à banca. A isto soma-se o Fundo de Recapitalização da Banca, que está no pacote da troika, de 14 milhões de euros. A maior parte das PPPs têm um banco na parte privada. Ou seja, não só sustentamos a banca durante dos últimos 30 anos com a especulação imobiliária, como continuaremos a sustentá-la nos próximos anos. Portanto, teríamos novos BPNs? Temos um encapotado agora. Portanto, nacionalizar a banca é semelhante a impedir a privatização da parte boa do BPN.
      Além do mais, uma banca privada é como uma arma apontada à cabeça do governo. Nenhuma economia nacional funciona sem crédito. Portanto, a banca dita as condições para a economia funcionar. Mesmo e neo-liberalismo radical de Passos Coelho caiu de joelhos ante esta capacidade da banca privada fazer parar a economia. E, ao receberem dinheiro da troika, os banqueiros – em especial Fernando Ulrich – tornaram-se capatazes da banca franco-alemã em Portugal. Repara: os banqueiros são os únicos que não protestaram ainda contra este Orçamento de Estado. Ainda que nos custasse alguma coisa a nacionalização da banca, era o preço justo para livrar-nos dessa arma apontada à nossa cabeça.
      A nacionalização a banca seria simples. Começaríamos pela exigência imediata dos dinheiro do Fundo de Recapitalização. De duas formas: ou em dinheiro ou em ações. Ao aceitar a segunda opção, o BPI ficaria praticamente nacionalizado. Nos outros, a participação do Estado aumentaria de forma significativa. Ao optarem por devolver o dinheiro, muitos bancos ficariam à beira da falência. O Estado deveria então usar o Fundo de Recapitalização da banca para garantir os depósitos dos clientes desses bancos… na Caixa Geral de Depósitos.
      A segunda medida é renegociar a dívida e das PPPs. Não esqueçamos que 70% da dívida pública hoje têm como credores os bancos portugueses (CGD e BCP à cabeça) que tamam dinheiro emprestado ao BCE com juros de 1% . Recusando-nos a pagar juros acima de 3,5% (o que ainda dá um lucro de 2,5% aos bancos), empurraríamos muitos bancos, com o BCP à frente, para a falência ou para o Fundo de Recapitalização. Este, a funcionar como coloquei acima, conduziria à nacionalização da banca.
      De facto, a nacionalização da banca é a consequência das propostas políticas do PCP. A diferença é que sinaliza o inimigo principal da classe trabalhadora como um bom discurso marxista deve fazer. E não colocar a questão de um modo “patriótico” em que somos todos amigos, nós e o Jardim Gonçalves.
      Abraço camarada.
      Comentário por Jose Ferreira | 21 de Outubro de 2012 | Comentar
  2. Para além de Jardim Gonçalves, houve outro banqueiro importante que tb se opôs mas cujo nome me não ocorre. E sendo certo que a nacionalização da banca se impõe, a verdade é que os banqueiros não vão nessa, salvo se forem eles a mexer os cordelinhos.
    Parece-me que o actual governo tentou tornear isso através dum banco estadual de investimento a criar, enquanto o mesmo tempo procura privatizar a CGD, de cujo grupo já retirou os seguros, como 1º passo.
    Portanto, salvo se essa for a directiva da UE, com este ps-psd-cds não há nacionalizações salvo estilo bpn – socialização dos prejuízos, privatização dos lucros. As gorduras ricas do bpn não foram nacionalizadas. Aliás, a actual crise capitalista é um bom exemplo.
    O bcp millenium é uma fraude, que só não teve o destino do bpn pk o joe berardo esperneou qd viu que lhe estavam a ir ao bolso com os empréstimos ao filho de Jardim que pretendiam “perdoar”. O BCP, apresentado como o exemplo da boa gestão privada
    Com efeito, em 2009 noticiava o Público que:
    « apenas seis clientes do BCP devem 3,5 mil milhões de euros (cerca de 80% da capitalização bolsista do grupo) ao grupo, que ontem tinha um valor de mercado de 4,3 milhões de euros.
    Os seis são a Mota-Engil, Teixeira Duarte, Soares da Costa, Cimpor, Joe Berardo e Joaquim Oliveira.
    Só a Mota-Engil contraiu crédito ao BCP no valor de 1,2 mil milhões de euros ao banco, ou seja, 28% da capitalização bolsista do banco»
    Aliás, em 2006 Joe Berardo fizera empréstimos junto da CGD, do BES e do BCP para adquirir acções deste , no valor de mil milhões de euros
    Na notícia fala-se na célebre colecção de arte berardo, que ninguém sabe ao certo se vale o que berardo diz que vale, “guardada” no CCB num escuro negócio do governo ps-sócrates com o beneplácito da então Ministra da Cultura e que levou à demissão duma sub-secretária de estado do mesmo governo, que é referido nesta súmula
    Comentário por Victor Nogueira | 21 de Outubro de 2012 | Comentar

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