segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A greve geral e a situação política


Fala Ferreira

Assim me saúdam os amigos de Guatemala.


A greve geral devia ter sido marcada hoje

Gostaria de ter ouvido, hoje, da boca de Arménio Carlos não apenas que a CGTP  anunciará, em breve, uma greve geral, senão a data de realização dessa greve. Até porque essa ação de luta deviria coincidir com a entrega do Orçamento de Estado na Assembleia da República, portanto, na semana de 15 a 20 de outubro – ou seja, daqui a três semanas! Por um lado, a entrega do OE será, seguramente, o momento de maior tensão intra-elitária. (A este respeito pode ver-se a troca de galhardetes de hoje entre António Borges e António Saraiva). Por outro lado, o Terreiro do Paço “cheio que nem um ovo” avalizaria a marcação dessa greve geral.
1. Para entender de forma acutilante o que está em jogo, é preciso corrigir a estratégia da central sindical. É necessário abandonar o corte nacionalista por detrás de “Renegociar a dívida! Rejeitar a troika!” e colocar a questão em termos de classe. (Se, pela necessidade de criar consensos alargados, a CGTP é obrigada a manter o corte nacionalista, isto podia ser facilmente resolvido se o PCP adotasse o corte de classe. Aliás, não se compreende porque as duas organizações têm a mesma estratégia sendo uma, segundo os próprios comunistas, unitária e a outra não).
É um facto que a classe trabalhadora e os partidos de esquerda não podem, no próximo ano, almejar chegar a governo. Portanto, a sua estratégia deve passar por destruir os instrumentos de dominação ideológica burguesa. Se a burguesia muda governos e queima cartuchos (queimou Sócrates, está a queimar Passos e vai queimar Seguro) para manter o seu programa, a tarefa dos partidos dos trabalhadores é, por agora, encurtar a vida desses cartuchos. Portanto, a tarefa imediata é derrubar o governo de Passos Coelho mesmo que, inevitavelmente, Seguro ocupará o seu lugar com o mesmo programa. E, na medida em que o PS tiver se envolvido na oposição ao atual governo, o seu reinado ainda será mais curso. As palavras de José Seguro hoje servirão contra ele amanhã.
2. Postas as coisas assim, é muito importante envolver as bases do PS nesta luta. E o PS está literalmente à espera para ver (já comentei isso aqui). A UGT recuou na proposta de greve geral – questão que a própria UGT levantou no passado dia 12 e mantinha há 4 dias atrás. Então, o adiamento daconvocação da greve geral para 3 de outubro dá, à CGTP, quatro dias para negociar com a UGT esta ação de luta. Obviamente, nenhuma agulha se acerta em tão pouco tempo. Ainda que fosse importante o contrário, pois o antagonismo entre as duas centrais sindicais deve aprofundar a tensão latente entre os trabalhadores, é muito provável que a CGTP tenha de fazer a greve geral sozinha. Por outras palavras, parece inútil esperar pelos socialistas.
3. A CGTP pode, pelo contrário, ter adiado a convocação por outras razões. Seja para seguir a burocracia da organização. A decisão de convocar uma greve geral tem de ser decidida em Conselho Nacional. Seja para impor, democraticamente, a realização de uma greve geral à grande franja de simpatizantes do PS que existe na CGTP. Num e noutro caso, a reunião extraordinária do CN foi marcada já para a próxima semana. De qualquer modo, não haveria diferenças formais entre o que Arménio Carlos disse hoje e ter dito, por exemplo, “A direção da CGTP proporá ao seu Conselho Nacional a realização de uma greve geral no próximo dia 17 de Outubro”. Se o tivesse dito, a greve poderia começar a ser preparada segunda-feira com todo o afinco. Mas não disse.
4. Pode, em alternativa, pretender convocar uma greve, como sempre, em torno do dia 20 de novembro. Então, nesse caso, há tempo. Mas também, nesse caso, a CGTP cumprirá, burocraticamente, a sua greve geral anual, completamente desencaixada de uma leitura fina do evoluir das condições subjetivas da luta dos trabalhadores. Se for assim estamos diante de um erro crasso.

4 Comentários »

  1. Falando em erros crassos, a tua afirmação – “… a CGTP cumprirá, burocraticamente, a sua greve geral anual, completamente desencaixada de uma leitura fina do evoluir das condições subjetivas da luta dos trabalhadores” -, é um bom exemplo.
    Informo que este ano já houve uma Greve geral promovida pela CGTP, 22 de Março de 2012 não te diz nada?
    Devias ter mais rigor.
    Comentário por Carlos Carvalho | 3 de Outubro de 2012 | Comentar
    • Caro Carlos Carvalho
      De facto, o teu comentário prova aquilo que eu penso de toda a esquerda portuguesa: não analisa a conjuntura. Claro que me diz! Tanto que saudei essa greve geral neste blog e digo que fui surpreendido pelo seu sucesso. A conjuntura aí era totalmente desfavorável a uma greve geral, a CGTP insistiu e correu bem acima das minhas expectativas.
      A conjuntura alterou-se radicalmente a partir do dia 7 de setembro. E isso pesa nas minhas considerações. Os últimos textos desse blog têm servido para analisar os vários aspetos dessa viragem de conjuntura. É uma conjuntura que permite acelerar a luta e não percebi porque o dia 14 de novembro não foi avançado no Sábado. Mais, não percebi porque não se faz a greve geral ainda em outubro. As massas estão em refluxo e quanto mais tarde menor será o impacto.
      Se para o PCTP a conjuntura nunca muda e todos os dias são bom para fazer greve; para o PCP a conjuntura só muda quando o comité central aprova. Isso chateia-me porque a conjuntura, por vezes, muda entre reuniões do comité central.
      Abraço

      Comentário por Jose Ferreira | 3 de Outubro de 2012 | Comentar
  2. Vou lendo os teus posts e não comentando na altura,, depois fico apenas com a memória e sem tempo para relê-los.
    Parece-me que por vezes esqueces que há um tempo e que o teu tempo é por vezes apressado e nem sempre atende à realidade
    Convocar uma manif estrondosa pelas redes sociais poderá ser fácil. Dar continuidade e aglutinar essa força para ir vencendo etapas exige muito mais.
    Pelos vistos, entre a data em que escreveste este post e a greve geral de 14 de Novembro há um tempo que tem sido preenchido por outras manifestações como rios que se juntam para fortalecer a corrente.
    E entretanto vai surgindo a consciência – ainda difusa – que é preciso um outro governo que não seja mais do mesmo. Um outro governo com outro programa e que tenha uma base social de apoio consistente.Que me parece não poderá no futuro incluir os órgãos dirigentes do ps-sócrates-seguro.
    Mas para isso é preciso que a base social do ps descole deste ps sócrates-seguro
    Comentário por kantoximpi | 21 de Outubro de 2012 | Comentar
    • Amigo e camarada Victor
      Sem dúvida, esse foi um texto precipitado; mas não totalmente errado. O meu ponto de partida era este: 1) A contestação social estourou dia 7 de setembro com a apresentação das medidas do Orçamento de Estado, mas logo após o dia 15 entrou em refluxo. 2) O BE, que marcou a manif de dia 15, foi capaz de antecipar isto. Sorte? Inteligência (no sentido da espionagem: pessoas a compilar informação sobre a Grécia para saber o que contar)? Fiquei com pena da CGTP não ter antecipado também a explosão e ter, previamente, preparado uma greve ainda em setembro. 3) Nesse momento, o PS teria sido obrigado a vir com a CGTP. Esse compasso de espera apenas serviu para a UGT e Seguro ganharem tempo para sacudirem a água do capote.
      Contudo, a coisa não foi tão má assim. As condições subjetivas tendem a ficar mais tensas com a discussão do Orçamento de Estado. A as brigas entre frações da elite facilitam a luta contra ela. Desse modo, pode ser que as condições voltem a aproximar-se daquelas da segunda semana de setembro. E que o governo caia! A internacionalização da greve geral foi uma grande conquista.
      Mas a minha crítica é mais funda ainda. Falta, em todos os partidos de esquerda, um estratega da craveira de Lénin ou mesmo de Álvaro Cunhal. Fico com a impressão que nem o PCP nem a CGTP conseguem antecipar a realidade e, por isso, correm sempre atrás do prejuízo. Fazem ainda assim um fantástico trabalho. Mas se queremos fazer a revolução, temos de ir mais longe. Em vez de organizar os grupos que a conjuntura já trouxe para a luta, temos de organizar os grupos que a conjuntura trará para a luta num futuro próximo. Para isso, o marxismo-leninismo terá de ser um método de análise da realidade presente, mais do que uma teoria.
      Estou a ser muito exigente?! Talvez. Mas é o resultado da angústia de quem queria estar aí para ajudar.
      Abraço
      Comentário por Jose Ferreira | 21 de Outubro de 2012 | Comentar
      • Caro camarada
        Este ps-sócrates seguro é, como se diz … irrecuperável. Foi ele, que com a ajuda do Bloco, que lançou Manuel Alegre, permitiu a vitória de Cavaco. Como foi com a ajuda de Sampaio PS que, após a fuga de durão/psd, permitiu a entrada triunfal do ps- sócrates.
        Há uma continuidade na política do ps desde a acção socialista portuguesa nas “eleições” de 1969. Já referi em notas que partilhei contigo o “”drama” do ps-seguro,, muito semelhante ao que tb presentemente vive o cds-portas. Fingem estar com um pé de fora mas estão enterrados no lamaçal até ao pescoço.
        Não creio que alguma vez o ps-soares-sócrates-seguro venha a ter outra política. Aliás, um dia destes o banqueiro Jardim Gonçalves defendeu uim governo de salvação nacional de iniciativa cavacal pk o ps é mias hábil que o cds. Mais hábil, entenda-se, para tentar recuperar apoio social para a troika
        Esta é uma situação “original para o ps que tem sido o cavalo que abre caminho às políticas de recuperação capitalista, desde soares, para a seguir, na oposição, malhar (verbalmente) forte e feio no psd. Pk desta vez foram o psd-cds que estão agindo sem máscara nem “receio” e prescindindo do ps-soares-sócrates-seguro. Ou antes e partindo das tuas análises, uma camada da classe dirigente pensou que poderia avançar a todo o vapor prescindindo da ajuda do ps-s.s.s.
        Sempre o ps-s.s.s arranjaria uma desculpa para não apoiar uma greve geral em setembro. Como por ele avançou a ugt. Creio que a ugt, nesta fase, está completamente desacreditada. Mas não a direcção do ps. E é esta que tem de ser desmascarada perante a sua base social de apoio. O desmascaramento será mais rápido se estiver comprometido com o psd num governo de iniciativa presidencial, deixado o cds de fora, como “oposição”.
        Ao ps interessa deixar queimar o psd-cds em lume brando. Mas sem se comprometer com a chamada extrema esquerda, isto ´é, como o Bloco, que procura seduzir, e, sobretudo, com o pcp.
        Aliás é interessante que o ps assis-sócrates catalogue o bloco e o pcp como extrema esquerda. Como o fazem os novos politicólogos nas suas análises políticas sobre o momento presente.
        Naturalmente e já o referiste num post, a cgtp e o pcp têm estratégias diferentes, mais recuada a da cgtp, centrada sobretudo nas questões/reivindicações económicas, mas que, não se ficando por ai, abram caminho às soluções políticas, mais ou menos radicais.
        E ao contrário do que deste a entender num teu post, parece-me que o pcp tem um objectivo que aparece no avante e estava presente na Festa – “Pacto de Agressão Não. Democracia e socialismo”
        Só que … É positivo que já seja possível coordenar internacionalmente acções sindicais. Ou organizar simultaneamente manifestações em vários países com objectivo semelhantes. Mas a nível político a divisão e a dispersão ainda são grandes E o fulcro da questão é … político. Dai a campanha contra os políticos e os partidos. Como se fossem todos iguais e a solução estivesse nos “independentes”,. Como se isto se ganhasse com manhosas independências.
        Comentário por kantoximpi | 21 de Outubro de 2012

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