CONTO DE NATAL
OU DE COMO NO MELHOR PANO CAI A NÓDOA
Era uma noite escura. O vento uivava entre os vidros partidos; de quando em vez um relâmpago rasgava o horizonte, iluminando com um tom esquálido o quarto onde sobressaiam uma tosca mesa, as malgas vazias e quatro desconjuntadas cadeiras. A um canto, encurralados, cinco ratinhos tremiam, não se sabendo bem se do frio, se do receio da enorme bota cardada que rapidamente descia sobre as suas lindas cabecitas, de bigodinhos eriçados.
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Subitamente, ouviu-se um tremendo chop e um líquido vermelho esparramou-se e salpicou de rubro o lívido rosto de duas criancinhas que desalmadamente choravam a morte dos seus queridos hamsters.
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Uma senhora rica e bondosa lhes tinha dado na véspera, quando pelo amor de Deus e da Virgem sua mãe pediam uma esmolinha, por causa do pai não receber salário há dez meses!
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Soluçando aflitivamente as criancinhas, agarradas à saia da sua mãe, que era virgem não o sendo balbuciavam:
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“Já não temos ratinhos para a Ceia de Natal”
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Setúbal 1987.10.23
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