terça-feira, 13 de maio de 2008

OS DIAS DA REVOLUÇÃO (notas soltas)

Evolução de Évora – a situação em 1975

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mapa e artigo sobre os problemas urbanísticos de Évora e a 1ª Comissão Admnistrativa da Câmara Municipal em maisevora.blogspot






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* Victor Nogueira
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A Rádio Renascença transmite "Os Vampiros", do Zeca Afonso! Rei morto, Rei posto! A Junta de Salvação Nacional, como a si própria se intitula, abre a tarracha e já hoje tornou público o seu programa, cujo ponto limite é a realização de eleições gerais para a Assembleia Constituinte e Presidente da República no prazo de 12 meses.

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No café Estrela, velhos falam dizendo que os jovens de agora são melhores que no seu tempo: "A gente também não concordava com o Salazar mas nunca tivemos coragem de fazermos o que eles fizeram.". Nas imagens que a RTP transmite a nota dominante entre os manifestantes e os mirones era a juventude. Outro velho diz que nunca foi marcelista.

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(MCG - 1974.04.26)

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O Telejornal transmite a libertação dos presos políticos do Forte Caxias. (...) Uma grande multidão - milhares de pessoas aguardaram duram mais de hora e meia pela chegada do cortejo automóvel que acompanhava os presos políticos libertados - uns 3 ou quatro, um dos quais há 12 anos. (1) (...) Na placa central da Praça do Giraldo um grande magote de pessoas estão comprando "A Capital". São autênticas corridas aos jornais, avidamente disputados, como os dos últimos dias. Toda agente anda de jornal debaixo do braço ou lê-o à mesa do café ou especado na rua. Até, oh! surpresa, raparigas! (Muitas mulheres têm tanta pena do Marcelo [Caetano], coitadinho, tão simpático, tão amigo do povo!) SAFA! A caça aos PIDES continua. (...)

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Passaram hoje em Évora uma coluna de carros de assalto, jipões e jeeps. Os soldados iam sorridentes, acenavam, alguns tinham flores nos canos das armas. Os populares gritam "Obrigado, rapazes!" e eu depois tenho pena de não ter correspondido ao aceno dos militares, apesar de estar comovido. (...) O 1º de Maio - Dia do Trabalhador - é finalmente feriado. Prevê se uma manifestação, que de resto agora são livres. [Antes do 25 de Abril, no ISESE, o 1º de Maio era feriado - dia de . José Operário, cuja estátua com esta inscrição estava no cimo do 1º lance de escadas do antigo Palácio da Inquisição]

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(...) Viste o TV 7, ontem, domingo? É muito para um homem só ouvir finalmente, aquilo que alguns pensavam, muitos sentiam, mas não se podia dizer. E sobretudo o fim da guerra colonial, o direito à greve... Não, (...) não creio que se possa retroceder. A luta dos próximos tempos será de morte (não, não me refiro à guerra civil!); espero que o povo português não perca tudo o que pretenderão tirar lhe: uma sociedade mais justa e humana. Mas de algo estou certo: "a longa noite do fascismo não voltará!". (MCG - 1974.04.27/28) [talvez tenha voltado, mais aofisticada mas não menos violenta - 2008.05.13 - data da 1ª Aparição aos pastorinhos em «Fatma», terra que foi dos árabes]

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Acabei de jantar, hoje sózinho. Os meus colegas foram até Lisboa em excursão para serem recebidos pelo MEC [Ministério da Educação e Cultura]. Eu fiquei! Agora janto aqui numa casa particular, perto do RI 16 [Regimento de Infantaria 16]. Gosto da casa - por dentro - e a comida não é má. (25 paus por refeição) (2) (MCG - s/data 1974.05.29)

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É segunda-feira em Évora. O Arcada vozento e cheio. Circundo o olhar e não reconheço a maior parte das pessoas, que falam com grandes movimentos das mãos e do corpo - alguns - ou lêm o jornal: "A Bola" ou "O Século". Está um dia luminoso e soalheiro, este ano sem desfiles militares. Jovens esquerdistas cá do burgo pretendiam organizar um comício anti-colonialista mas parece me que ficou tudo em águas de bacalhau

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(...) Tirando os jornais, praticamente desde o 25 de Abril nada mais tenho lido; quase não paro em casa e tenho também um certo desassossego em mim, porque o tempo nem sempre tem sido eficazmente aproveitado. Para além disso o tempo dum homem é também para o amor e ternura e estes têm estado ausentes. Enfim... (Sabes, é bom também sentir se o corpo duma mulher junto a nós, porque o amor e a ternura não são só palavras, muito menos apenas escritas, mas também a possibilidade de se manifestarem nos gestos.

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Sinto me alheio ao que se está passando em Portugal. Alheio não porque me desinteresse, mas porque me escapa o significado de muita coisa (desde há dois anos que deixei quase de estudar para compreender a realidade do que me cerca) Sinto me assim ultrapassado numa altura em que o desenrolar dos acontecimentos exige uma grande lucidez) (MCG - 1974.06.10)

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Hoje esteve um dia bonito e fresco, durante o qual estiveste muitas vezes no meu pensamento. O vento ligeiro agita as antenas de TV no telhado, enquanto andorinhas chilreiam e cruzam o céu azul.

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É já ao entardecer. (MCG - 1974.07.14)

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No café, ontem, a "Capital" aberta sobre a mesa, ia lendo a notícia, antes, o discurso do Spínola, uma grande emoção subindo por mim: finalmente a independência para o meu País. Angola livrar se à, finalmente, da tutela asfixiante de Lisboa. Mas... quem vencerá? O capitalismo internacional ou os povos de Angola, Guiné e Moçambique? O reconhecimento do direito à independência é já um primeiro passo, mas a luta continuará. Pois é, minha linda, mas não tinha ninguém com quem partilhar a minha alegria. Ao contrário desta malta que, desde há pouco, em longa fila de automóveis, buzinando estridentemente, sobe a rua Serpa Pinto, circundando várias vezes o Giraldo e segue pela R.S. João de Deus. Vão sorridentes e acenantes, agitando bandeiras azuis e brancas, as pessoas concentrando se sorridentes nos passeios. Pergunto ao meu vizinho o que se passa e a resposta vem breve: "O Juventude" passou à 2ª divisão!" Ah!Ah!Ah!

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Ontem, no comício do PC, ali no Rossio de S. Brás, o Álvaro Cunhal falou na independência dos povos das colónias. Mas nem uma única palavra, ou referência, aos movimentos de libertação: MPLA, FRELIMO, PAIGC! (3) Ainda antes do Álvaro Cunhal falar o palco foi abaixo por duas vezes. Uma multidão imensa concentrava se em redor do palco, junto ao Monte Alentejano, agitando se inúmeras bandeiras vermelhas do PC. Em coro, a multidão repetia as palavras de ordem, de punho erguido. Detecto, junto a mim, um grupo de conhecidos. Quando se falam nas torturas sofridas pelo Cunhal e outro comunista, uma mulher ao meu lado diz me: "Coitadinho! Bandidos!" E a multidão grita: "Morte à PIDE!". Dois delegados dos Sindicatos Agrícolas (Évora e Beja) enumeram as quebras dos contratos colectivos de trabalho e o nome dos latifundiários. A multidão grita: "Morte aos cães!" "A terra a quem a trabalha!". Ao meu lado, algumas mulheres dizem: "É assim mesmo!" e "Essa sou eu!", quando se fala em ranchos despedidos. O Álvaro Cunhal cita as lutas revolucionárias dos trabalhadores alentejanos e a "palha" que os latifundiários teriam mandado dar aos trabalhadores que imploravam comida. E a revolta; que enquanto houvesse ovelhas, galinhas e porcos não comiam palha os trabalhadores!

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O Partido faz a sua campanha e no palco estão tipos que já conheço de há muito. Por detrás deles, enormes, em fundo vermelho, as efígies de Marx, Engels e Lenine. A brancura de Évora é agora quebrada por cartazes do PC. Marx, Engels e Lenine enchem as ruas, conjuntamente com cartazes com a foice e o martelo. (MCG - 1974.07.28)

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Numa curva da planície surgem as torres da Sé de Évora, mai lo seu casario branco. Como sempre, não sinto nenhuma alegria ao avistar o "burgo medieval". (MCG - 1974.09.01)

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Fui hoje ao ISESE: aquela malta anda pelos cantos, perguntando uns aos outros (e alguns a mim): "Então, que vamos fazer?" (MCG - 1974.09.02)

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Ainda não é meia noite e já foi tempo de jantar - que saudades do bacalhau cozido com grão! - e andar por aí, vendo as montras e dando umas voltas. As camisolas de gola alta estão caras: aproximadamente 500 paus! No Nazareth, muito "progressivo" - já não há PIDE para revistar lhe a loja [livraria]; exibem se, em plena montra, obras de Lenine e revistas de nus femininos, daquelas que após o 25 de Abril povoam os passeios, livrarias e tabacarias, para as pessoas fazerem o gosto ao olho e se irem masturbando, à falta dum corpo que possam amar, numa sociedade hipócrita e farisaica.(...) Passo pelas ruas de Évora, debaixo dos arcos [arcadas]. As pessoas cruzam se comigo e do café vêm o vozear e algumas gargalhadas, que extravasam para as ruas, agora cheias de papéis rasgados e com as paredes pintalgadas de cartazes. Évora, a cidade limpinha onde não se viam outrora cartazes, salvo os da ANP (4) em tempos de farsa eleitoral. No ISESE o piquete (5) saúda me calorosamente à minha entrada e, após algumas piadolas - por causa da pró-UNEP (6) - retomam o jogo das cartas. As casas de banho cheiram a ácido úrico. Puseram sofás num corredor do r/c e aí dormem os do piquete. Que os jesuítas consideram ilegal e abusivo. Pela paredes e bancos, o "Revolução", do PRP-BR, o "Luta Popular", do MRPP e comunicados e cartazes do MES e da Associação Portugal China. O ISESE é um reduto anti PC. Para muitos, creio que parece bem e está na moda! (7) (MCG - 1974.11.25/26)

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Évora é uma cidade estúpida. 6 meses de ausência (e se calhar a saturação de 6 anos) fazem me ressaltar toda esta falta de dinamismo, de interesse, de imaginação. É um encolher de ombros, um arrastar se pelos cafés, um encostar se pelas paredes, um nada ter que fazer ou para onde ir. Uma perfeita estagnação. Talvez que um tipo tendo casa e emprego, a coisa se torne menos monótona. Mesmo assim, acho que preferia mil vezes Setúbal. Tem mais movimento e não parece uma ilha como este burgo medieval. (...) Soou agora o apito do comboio da meia noite. (MCG - 1974.11.28)

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Aqui no café Estrela vão progressivamente substituindo as pequenas mesas de pedra preta e as cadeiras amarelas por amplas mesas brancas com armação preta e confortáveis e anatómicas cadeiras laranja. É o fim da manhã de domingo, um domingo cheio de sol mas frio. (MCG - 1974.12.08)

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Pouca terra, pouca terra, cá vai o comboio para Évora. (...) Despachei as malas - vêm no furgão, mas o saco com os livros pesa muito. Ali duas velhotas discutem as vantagens de ser criada de servir: ganham bem, vestem os vestidos da senhora, não gastam nada. Uma vida de fidalgas. Opiniões! Há pouco discutiam a nudez: passar aí um homem todo nú, que falta de moral e patati patata. Eu rio me a bandeiras despregadas e ela mete-se comigo. (MCG - 1974.12.10)

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Acabou de chegar o almoço. Isto não é comida para uma pessoa de alimento como eu. Évora deve ser das cidades onde se come pior. Parece que os alentejanos jejuam por sistema. Arre! (MCG - 1974.12.16)

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Ontem andei de avião sobre Évora, que é uma cidade bestial lá de cima. Foi a 2ª vez que andei de avioneta na minha vida - a 1ª foi em Angola, tinha para aí três anos. Tirei umas fotografias. (...) Aqui para nós, um pouco antes, quando o teco-teco começou a rolar na pista estava um pouco apreensivo, mas logo liguei à terra. Sobrevoámos a cidade, fomos a S. Bento, às piscinas, à Cartuxa, ao convento do Espinheiro. É bestial! (1974.12.23)

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O ISESE foi desocupado às 14:30, por decisão do Plenário de Estudantes. [Os jesuítas] vistoriaram o edifício, que foi achado em bom estado de conservação, apesar de não sei quantas lâmpadas fundidas, dum interruptor partido dum quebra luz partido - 15 contos (resultado duma bola mais alta) e duma poltrona combalida. (...) Nas instalações da Associação dos estudantes foi assinada a acta de desocupação, depois de mais discussão sobre os termos [da mesma] (1974.12.26)

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(...) São quase 13 h 30 m e tenho o estômago colado às costas; os empregados dos cafés e restaurantes estão em greve por causa do contrato colectivo de trabalho. É uma greve alternada: hoje há jantar e almoço amanhã; nesse mesmo dia não haverá jantar bem como nenhuma refeição na 4ª feira. (MCG - 1975.05.05)

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É já noite, durante o jantar, aqui no poiso habitual que é o "Manuel Iglésias". Choveu todo o dia, por vezes a cântaros, e esteve um frio desagradável. (MCG - 1975.02.11) Embora me aborreça o gigantismo de Lisboa, obrigando a perder imenso tempo em percursos, a verdade é que o contraste entre os montes de malta amiga ou simplesmente conhecida de Lisboa e a pacatez sorna de Évora fazem me detestar toda a vida estúpida de Évora. (MCG - 1975.01.02)

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A propósito de calor... parece que o ambiente "aquece". Manifestações, contra manifestações em Lisboa, ameaça de golpes em Luanda, manobras da NATO (organização anticomunista) em Portugal... Entretanto os rurais do Baixo Alentejo iniciaram a ocupação das terras, organizando milícias populares armadas. Enquanto isso a Emissora Nacional vai falando cada vez mais "revolucionariamente", enquanto por essa Europa fora, aproveitando-se do boicote ao comício do CDS, os partidos burgueses se preocupam muito com [...] "ditadura" das esquerdas, eles que nunca se preocuparam com a ditadura fascista. As ocasiões definem os amigos (MCG - 1975.01.30)

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Hoje fui até uma herdade aí para a Estrada de Arraiolos, que os trabalhadores ocuparam. Agora é que os latifundiários começam a não gostar. (MCG - 1975.02.03)

Chove, nesta tarde de inverno. Rápido, o matraquear da máquina deixa atrás de si um rasto de letras. O céu está cinzento, a soleira da porta alagada. Ouvem-se as bátegas da chuva no lajedo da calçada, enquanto o Olímpio e outro camarada assobiam, por entre o tac-tac ensurdecedor que atroa a sala da Associação dos Estudantes. (...) Entretanto o ambiente aquece aqui na sala com o "revolucionarismo" do C., que quer destruir - verbalmente - o poder burguês! Rajadas de palavras cruzam o ar, por causa do colectivismo e da anarquia! (...) Bem, vou tomar ar para outra freguesia: ler o jornal, lanchar e espairecer. O C. continua ao ataque, contra a escola burguesa, contra os professores, pela escola anarquista, com intervenções verdadeiramente revolucionárias, que não devam nada à burguesia e à sociedade de consumo. "Destruamos a civilização, contra os autoritários que não querem destruir as instituições mas reformá-las. A prática quotidiana dirá o que surgirá dos escombros das instituições burguesas destruídas pelos anti-autoritários." Terminada a "Revolução Ca...tiana", há um intervalo para um bagacinho. Mas o bar está fechado e o C. sobe ao balcão e num brilhante improviso convoca os presentes para se juntarem à classe operária pela destruição do capitalismo com a Manuela a fornecer as balas para a G 3, porque "a Revolução não está no verbalismo pequeno-burguês mas na ponta duma espingarda". O ambiente aquece à medida que se aproxima a hora da revolução, perdão,... da avaliação. (MCG - 1975.02.08).

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Anteontem fui com o João Luís, o Brito e outros até Estremoz, onde na "Flor do Alentejo" um grupo de marialvas, bêbedos e disfarçados de mulheres, atroavam os ares com "vernaculidades" e vivas ao CDS e ao PS (Partido Salazarista), gritando que "mais vale ser fascista uma hora que democrata toda a vida" (Onde é que eu já ouvi isto?!) Enfim, a reacção ainda (ou já?) vai falando! (MCG - 1975.02.11)

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Safa, que a barulheira aqui no café repentinamente tornou se incomodativa, especialmente com a gritaria das crianças e o velho aqui atrás de mim tamborilando com a moeda no tampo da mesa.

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Lá fora chove a cântaros e um cartaz anuncia "Pides na Grelha", brevemente nesta terra. As pessoas passam enfiadas debaixo dos guarda chuva e de vez em quando uma lufada de ar frio invade o café, quando alguém empurra a porta. De hoje a dois meses, segundo o Costa Gomes (8) haverá eleições [para a Assembleia Constituinte]. "O voto é a arma do povo" , só que o povo deve andar muito... desarmado. (...) É Carnaval, mas não parece, salvo um ou outro mascarado pelas ruas e uma ou outra criancinha. O tempo não está para folguedos, salvo em Lisboa, onde cerca de 20 000 a 40 000 organizaram uma manifestação contra o desemprego e contra o imperialismo e a NATO. (...)

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Évora agora "civiliza se": teatro, cinema, concertos... Bem, cinema é como quem diz. A maior parte dos filmes nada vale, segundo o meu critério. 5ª feira vai um, filme que gostaria de ver: "Ferido na Honra" mas... tenho aulas [como professor, o emprego de recurso após a licenciatura]. Na 6ª devo ir ver um filme do Jerry Lewis, "Uma Poltrona para Três", salvo se ainda houver ballet russo a preços (pouco) populares - 60 palhaços.

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A porta vai e vem, as pessoas passam na rua, cartazes continuam anunciando realizações já efectuadas: comícios da FREP (Frente Revolucionária dos Estudantes Portugueses), no Pavilhão dos Desportos, em Lisboa, a 24 de Janeiro, do PS (que foi lá em baixo na Praça de Touros), do MES (uma "barracada" no [Teatro] Garcia de Resende) (9)

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São 10 h 25 m dum sábado do meu 29º ano de existência. Na mesa, os restos do pequeno almoço: o bule vazio de chá. um bocadito de pão ainda com manteiga, restos do pacote de açúcar. Uma natureza morta! (MCG - 1975.02.17)

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O movimento grevista do ensino secundário alastra se a todo o País. O Liceu de Évora está ocupado desde o fim de semana passado, por tempo indeterminado. Na Escola Industrial os cursos complementares declararam greve desde ontem às 14 horas. À tarde aperceberam se que tinham faltas - porque os professores as marcavam - e deliberaram apoderar se do livro de ponto, o que fizeram num ápice. (MCG - 1975.02.25)

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No Liceu há uma RGA: não sei se abolirão ou não a greve. [Terminaram a greve] Na Escola, os alunos estão despolitizados. No fundo são... "bons rapazinhos" (ou rapariguinhas) (MCG - 1975.03.06)

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São 17:15. Os alto falantes transmitem canções de luta e apelos à vigilância revolucionária. De regresso do almoço um aluno entregou me um comunicado do PCP relatando o ataque ao RAL 1, em Lisboa. As ruas estão cheias de gente - os empregos fecharam. Não sei ainda o que isto vai dar: ou avança... ou recua. (...) Um outro comunicado há pouco transmitido inclui entre os implicados na intentona os generais Spínola e Galvão de Melo, que já teriam "cavado". (MCG - 1975.MARÇO.11)

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Os dias estão maravilhosos e cheios de sol. As andorinhas enchem a Praça do Giraldo com os seus chilreios. (...) Está um domingo maravilhoso, daqueles que convidam à camaradagem e alegria. (data?)

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(...) Está uma tarde maravilhosa: uma tarde verdadeiramente primaveril. [quinta feira da espiga]. A "malta" foi para o campo; a mim também me apetecia ir, mas ir com eles todos era quase o mesmo que ir sózinho. A primavera é para o namoro e a camaradagem. Assim... vim para casa, lavei a roupa e sentei-me aqui à mesa a estudar: os primórdios do capitalismo e as ideias liberais. Cá recebi os teus "conselhos" para a lavagem da roupa. (MCG - 1975.03.20)

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Começou ontem a feira eleitoral. À meia noite o PPD colocava cartazes, com a ajuda dum escadote. Hoje, chegou a vez do PCP, nas colunas dos arcos. Por seu turno o PS, na Escola, distribui autocolantes "Vota no PS" e sacos de plástico (MCG - 1975.04.02)

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Depois da revolução dos cravos... a guerra dos cartazes e das pinturas. Évora está uma autêntica batalha mural, quase parecendo uma velharia - no fundo o que a cidade sempre foi e a caiação escondia. (MCG - 1975.04.03)

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Uma flor - a primeira - nasce lá no quintal. Mas as outras ainda não deram sinal de si (...) 2ª houve um comício do PPD no Garcia de Resende que foi boicotado por todos os partidos de esquerda, incluindo o PS e o PC. Mas eles conseguiram levá lo até ao fim. (MCG - 1975.04.11)

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Ontem fui à espiga, com uma das minhas turmas. (MCG - 1975.05.09)

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Acabei de jantar aqui no "Manuel Iglésias". São 21 horas e não me apetece ir para casa. Gosto do convívio social e de estar com as pessoas. Mais um dia de aulas! (...) Ontem foi o último dia de cinema, que só reabrirá lá para o mês de Julho. Até lá teremos [a] Feira [de S. João]. Vamos lá ver se continua em decadência. (MCG - 1975.06.16)

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Já recebi o ordenado. (Agora são, líquidos, 8025 $ 00, descontando uns 675 $ 00. Para quê, não sei) (MCG - 1975.07.25)

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O rádio transmite canções sobre o campo, a música "revolucionária" que o tempo permite. "Ceifa, ceifeira, ceifa, enche o celeiro da cooperativa". A reforma agrária vai andando. Há problemas por causa da vigilância das searas, receando se que os agrários e seus lacaios lhes lancem fogo. Isto para além de problemas que surgem devido à falta de silos para armazenagem dos cereais, de máquinas para a ceifa (pelo que o trabalho terá que ser feito à mão) e de crédito para os trabalhos do próximo ano. Enfim, é preciso coragem e determinação. (MEB - 1976.06.01)

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Os campos agora estão ressequidos e o calor aperta. Só à tardinha e à noite apetece sair. (MEB - 1976.06.15)

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Safa, isto hoje é chuva sobre chuva! Já aborrece tanta água. Estou aqui num café ao fundo da Rua Serpa Pinto, para alinhavar estas linhas. Passei agora pelo Sindicato onde arranjei uma colecção das teses da Conferência da Reforma Agrária.(1976.11.11)

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1 - Dois deles eram o António Gervásio e o Diniz Miranda.

2 - Seria a casa do sr. Rolo, de que falo noutra carta? (MCG - 1974.06.24)

3 - Movimento Popular de Libertação de Angola, Frente de Libertação de Moçambique, Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde.

4 - Acção Nacional Popular, partido único legal, que sucedeu à UN - União Nacional, após a substituição de Oliveira Salazar por Marcelo Caetano na Presidência do Conselho de Ministros anterior ao 25 de Abril.

5 - O ISESE fora ocupado pelos estudantes, na sequência de desacordos com a direcção da Companhia Portuguesa de Jesus, vulgo Jesuítas, detentora do alvará.

6 - pró União Nacional dos Estudantes Portugueses, organismo criado após o 25 de Abril, conotada com o Partido Comunista Português.

7 - MES - Movimento de Esquerda Socialista, MRPP - Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado, PC - Partido Comunista Português, PRP-BR - Partido Revolucionário do Proletariado - Brigadas Revolucionárias.

8 - Presidente da República, nomeado pelo Movimento das Forças Armadas.

9 - Ontem houve um comício do MES, não sabem falar às massas (ao contrário do PRP e do Miguel Bacelar) e usam uma linguagem abstracta e termos difíceis. Não foi uma grande sessão. (MCG - 1975.01.27)

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