De Luanda a Cambambe
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Saímos de Luanda às 4 horas da madrugada, tendo regressado às 22 horas. Passámos por Viana, Catete, Maria Teresa, Dondo, etc.) Almoçámos na cantina da barragem. No Dondo parámos. Fui à capela de lá.
Atravessámos vários rios: Cuanza, Lucala e outros. Visitámos a barragem. As ruínas da antiga povoação estão cobertas de capim. (Diário 1962.06.17)
Outra viagem - 7:40 - início da viagem Luanda, Catete, Dondo, Cambambe A mãe conta o filme “O Livro de Saint Michele”
Às 8 horas parámos na estrada. Ouviam‑se os pássaros a chilrear. Ao km 44 a paisagem é a savana, com muitos arbustos. Predominam o capim e as mangueiras. O dia mantém‑se enevoado. Às 8:15 desapareceram as mangueiras e aparecem os imbondeiros e árvores candelabro. O capim encontra‑se queimado. A estrada, embora asfaltada, encontra‑se com muitos solavancos. Estamos a 5 km de Catete. Gosto de ver os imbondeiros ao longe. De quando em quando aparecem uns eucaliptos.
Estamos perto de Catete. Já se avistam sanzalas e bairros para indígenas. Paramos junto a um posto militar de controle. São cerca de 8:20 e a vegetação é rasteira. À beira da estrada e até ao horizonte não se avistam árvores. Passarinhos encontram‑se à beira nas linhas telefónicas, ao longo da estrada. Reaparecem os imbondeiros. Aparecem manchas verdes, não amarelecidas mas sim viçosas.
Às 8:40 passamos por uma sanzala, onde há acácias, palmeiras e coqueiros. Na EN 3 há uma estância, de aspecto acolhedor, à venda. Passamos por um aquartelamento militar, onde há umas carteiras e quadro negro, sob uma árvore frondosa. A E.N. 3 é agora aos altos e baixos. Ultrapassámos um jipão militar, com reboque, no qual iam dois soldados armados com espingardas metralhadoras.
Chegamos a Barraca às 8:50. Paramos numa patrulha militar. Pela 2ª vez perguntam‑nos se trazemos armas de fogo.
Ao km 105 aparecem eucaliptos ao longo da estrada. Passamos por Maria Teresa, povoação pequena, cujos habitantes foram todos assassinados no fatídico mês de Março de 61. Vegetação exuberante.
Ao km 113 há imbondeiros e precipícios. Ao km 126 (9:11) chegamos ao Zenza e entramos no distrito de Cuanza Norte. Passamos pelo sítio onde matabichámos da última vez que fomos a Cambambe. A vegetação é luxuriante e há um pequeno rio temporário e imbondeiros. A linha férrea segue do lado esquerdo da Rodovia. Os frutos do imbondeiro fazem‑me lembrar ratos pendurados pelo rabo. Coqueiros.
Estudos: «Alquimia da árvore» - Pau de Imbondeiro, 2007
(Eleutério Sanches) no Blog Mukandas do Estoril
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Os fios que transportam a energia das Mabubas a Luanda passaram para o nosso lado esquerdo. O sol continua encoberto.
A 125 km do Dondo há uma sanzala. São 9:30. Passamos pelo Rio Lucala. O rio Mucoso [?] está seco. A paisagem é de outeiros e há bananeiras.
Chegamos ao Dondo. São 9:45. À entrada há casas género bairro operário. Paramos no jardim, bem arranjado, e com uns bancos rústicos, candeeiros e um coreto, tudo com aspecto antigo, embora arranjado. Ao fundo uma rua, ladeada de casas antigas e árvores frondosas. Do lado esquerdo da praça, a igreja.
A igreja de Cambambe (ou Dondo?) é modesta, sem estilo arquitectónico. À saída encontrámos o Ruca, filho da Beatriz. Está muito sério, a tropa modificou‑o fisionomicamente. O terreno agora é mais acidentado. Demos uma boleia a um tropa até Cambambe, onde chegámos às 10:20. Dentro de Cambambe há um bairro, com casas modernas e arvoredo. O terreno é acidentado e há uma pousada. Há um cinema, com bilhetes a 50$00, às 5ªs e domingos.
Visitámos a barragem, cujas turbinas giram a 230 rotações por minuto. A 1ª fase da construção está concluída. O rio passa a um nível superior ao das turbinas. A água sai pelo descarregador com uma força impressionante, oferecendo um aspecto maravilhoso.
Visitámos as ruínas da antiga povoação de Cambambe. Fomos até à ponte do Rio Cuanza. Almoçámos num restaurante duma estação de serviço FINA, a uns 8 km da povoação: bife com ovo estrelado... e batatas fritas.
Às 14:45 demos início ao regresso a Luanda. No Dondo está sol. Na viagem de ida e volta a Luanda percorreram‑se cerca de 430 km. (Das notas manuscritas da viagem, 1964.06.14)
De Nova Lisboa a Luanda, por terra - Relato I
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13 de Setembro - 5ª feira
8:00
Saída de Nova Lisboa (Eu, a mãe e o Zé)
9:00
Vale do Queve. Povoação em franco progresso, situada a 1600 m de altitude.
9:25
Atravessámos o rio Lumbuambua.
Chicala
9:40
Chololo. Atravessamos os rios Chilongo e Culele.
10:15 -10:40
Vila Teixeira da Silva - sede do concelho do bailundo. Altitude 1640 m. Vila airosa e electrificada. Tomamos aqui o pequeno almoço.
11:30
Santa Cruz - Plantações de bananeiras. Região montanhosa, coberta de arvoredo.
11:50
Jambacita
12:25
Cachimbombe. Pouco depois encontramos um cortejo nupcial. As duas noivas iam vestidas de branco, seguidas por numeroso séquito, batendo palmas e cantando.
12:35 - 13:40
Hengue - Possui uma modesta pensão estalagem onde almoçámos. A comida não era nenhuma maravilha: sopa de feijão (que não comi), pasteis albardados (muito aldrabados) com salada, arroz branco (parecia cola) com chouriço e galinha. Conclusão - 50 paus
14:30 - 14:40
Namba
14:45
Entramos no distrito do Cuanza Sul. As regiões que estamos a atravessar são muito montanhosas.
16:10
Avistamos uma das aldeias do colonato europeu da Cela.
16:15
Avistamos outra das aldeias.
16:20 - 17:00
Altitude 1300 m. Possui luz eléctrica. Lanchamos no Bar do Passarinho. Bebi uma laranjada e comi dois ovos cozidos e dois bolos. Sede do colonato europeu da Cela. O seu fim é “transplantar para Angola aldeias da Metrópole, sem pretos”.
Cada família recebe casas, terrenos com culturas, bois e tudo o que é necessário até ao valor de 150 contos, que pagará em 25 anos. Aqui se cultivam, por assim dizer, o mesmo que na Metrópole. Cultiva‑se milho, batatas e feijão. A primeira aldeia a ser construída foi a do Vimeiro, que é conhecida por aldeia nº 1. Cada aldeia compõe‑se de 25 a 28 casas, armazém geral, capela, posto de socorros, escola, chafariz com água canalizada. As aldeias encontram‑se ligadas entre si por boas estradas. Até Maio de 1958 gastaram‑se 297 mil contos. As culturas principais produziram, em 1957/58, cerca de 7000 toneladas de milho, 2500 de arroz, 3000 de batatas. Além de outros géneros criam‑se bois, porcos, galinhas, patos e perus. Clima subtropical.
17:03
Santa Isabel - aldeia nº 5
17:10
Carrasqueira
17:15
Avistámos outra aldeia
18:40
Catofe. Há um bom bocado de estrada asfaltada até Catofe. Indústria de lacticínios.
18:45
Quibala - Vila, sede de concelho do mesmo nome. Possui luz eléctrica e campo de aviação. Altitude - 1340 m. Clima subtropical seco. Dormimos numa pensão. O nosso quarto era o nº 4 e era razoável. Comida idem aspas. O jantar foi sopa, que não comi, peixe frito com salada, arroz com bifes e bananas. 150$00
14 de Setembro - 6ª feira
Acordámos às 5:45. Matabichámos. Tome café com leite e pão.
6:40
Partida da Quibala
6:42
Passámos pela missão católica de N.Sra das Dores, a 3 km da Quibala, com oficina de carpintaria e outros ensinamentos aos indígenas.
6:50
Passámos por um cemitério arruinado, que parece muito antigo. Perto havia uma sanzala abandonada.
6:53
Vi mais ruínas, perto da estrada. Árvores de pequeno porte e muito capim.
7:00
A estrada em certos pontos parece‑se com a de Robert Williams/Nova Lisboa, embora a paisagem seja diferente e a estrada não seja asfaltada.
7:05
Saímos das estrada principal, devido a trabalhos nesta.
7:15
Voltámos à estrada principal. A paisagem é triste e o céu está cor de chumbo, dando a impressão que vai chover.
7:20
Tornamos a sair da estrada principal.
7:25
O Sol rompeu as núvens, mas foi logo encoberto. Parece que a natureza se associa ao meu estado de espírito. Está frio e vou gelado. Que diferença entre esta paisagem e a de ontem, com sol, eucaliptos e cedros!
7:30
Voltamos à estrada principal. O céu continua triste e a paisagem desoladora.
7:40
Passamos entre pequenos montes, cujos cumes estão cobertos de nevoeiro, dando a impressão de um gigantesco incêndio.
Paisagem triste, com pouca vegetação e montes pedregosos.
7:55
Está tudo coberto de nevoeiro. Não se vê quase nada.
8:10
Atravessámos o rio Longa. Floresta de eucaliptos. Há muitos quilómetros que os não via. Estrada está pronta a ser alcatroada.
8:15
Lussulo - Recebemos correio
8:25
Andámos mais ou menos um km de estrada asfaltada.
8:30
Continua tudo coberto de nevoeiro e a paisagem não é nada encantadora.
8:35
Pequeno troço de estrada asfaltada.
8:40
O nevoeiro está cada vez mais cerrado.
8:42
Saímos da estrada principal.
8:44
Subida íngreme. O autocarro vai a 10 km/hora.
8:50
Entramos na estrada principal. Num desvio estava voltado um camião carregado com sacos de cimento. (APC - 06 - 58)
8:52
Saímos da estrada principal. Subidas e descidas muito íngremes. Região montanhosa, quase sem vegetação.
8:55
Retomámos à estrada principal. O nevoeiro quase que passou. Palmeiras. Estrada pronta a ser asfaltada.
9:05
Estrada asfaltada. Atravessamos um rio.
9:15 - 9:50
Atravessamos o rio Mucongo. Tomamos o pequeno almoço no Munenga. Acabou o pão de ló que a sra. D. Maria Delfina nos oferecera. Bebi uma laranjada e comi pão com manteiga.
Plantações de palmeiras, bananeiras e sisal. Altitude 434 m. Clima tropical muito quente e húmido.
10:00
Palmeiras. Finalmente vi capim verdejante. Já estava farto de capim seco. Começam a aparecer imbondeiros Vegetação cerrada, mas ressequida. Montes cobertos de verdura.
10:15
Montanhas com o cume coberto de nevoeiro. Tal como há horas, tenho a ilusão que as montanhas são presa dum incêndio.
10:20
Atravessamos um rio. No rádio transmitiram uma música dos “Conchas”. É pelo menos a sexta gravação deles que ouço hoje, sendo três de enfiada.
10:35
Seguimos por um desvio devido a obras na estrada principal.
10:50
Voltamos à estrada principal. Aparecem imbondeiros com mais frequência. Atravessámos um rio.
10:55
Rio Cuanza - O seu caudal esta muito reduzido e o leito em grande parte está seco. Ao pé da ponte há diversos rápidos. O Cuanza nasce no planalto do Bié, desaguando ao sul de Luanda. Tem um percurso de 1000 km, 258 dos quais navegáveis, incluindo o seu afluente Lucala.
O Rio Cuanza tem um grande valor económico. No Cuanza médio encontra‑se a barragem de Cambambe. No rio Lucala encontram‑se as célebres Quedas do Duque de Bragança (100 m de altura) Avistamos ao longe Cambambe.
11:10
Passámos perto de Cambambe, onde se encontram as ruínas da povoação do século XVI, e a barragem. Entrámos na EN nº 5.
11:25
Tornámos a avistar Cambambe. Seguimos na EN nº 3, que segue até Luanda. As ruínas de Cambambe são constituídas pela antiga Igreja de N.Sra do Rosário, resto das muralhas e fosso da fortaleza, e ruínas de outros edifícios. Está bastante calor.
11:30 - 12:55
Dondo - Chegámos ao Dondo, o “Ouro Preto” de Angola. Está muito calor, que me incomoda bastante. Na Praça da República há um jardim com um coreto. Naquele, escrito com relva, lê‑se ”Aqui é Portugal”.
Vila, sede de concelho de Cambambe, é uma povoação muito antiga. Possui energia eléctrica. Clima tropical quente. O Dondo foi uma importante povoação nas duas últimas décadas do século passado e princípios deste. Já naquele tempo possuía hospital, bons prédios, ruas alinhadas, etc. Com a construção do CFL (Caminho de Ferro de Luanda) as casas comerciais distribuíram‑se ao longo da linha férrea e a vila perdeu muita da sua importância comercial.
Actualmente, com a construção da grandiosa barragem de Cambambe, a vila desenvolver‑se‑à imenso. Possui ruas arborizadas e asfaltadas. Prédios antigos e modernos. Culturas de palmeira e sisal.
Almoçamos no Bar Passarinho: um prego e uma laranjada. Foi a 3ª vez que estive no Dondo. O ajudante de motorista, o Sebastião, desapareceu, mas por fim lá apareceu todo esbaforido. Meteram gasoil no autocarro.
13:00
Passamos o rio Menoza, cujo leito estava completamente seco.
13:20
Passamos o rio Lucala. Estamos a 160 km de Luanda. Plantações de palmeiras e bananeiras.
13:25
A estrada ora é de pedra britada, ora asfaltada.
14:10
Zenza (do Itombe) - Possui energia eléctrica. Sede do Posto do mesmo nome. Alt. 87 m.
14:12
Atravessamos o rio Dala Gola.
14:30
Entramos no Distrito de Luanda. Maria Teresa - 117 km de Luanda. Culturas de algodão.
14:50
Começam a aparecer os primeiros cactos candelabros.
Barraca - 99 km de Luanda - Plantações de algodão.
15:05
Calomboloca - Alt. 100 m. Povoação com. de 4ª. Aquartelamento militar, com escola ao ar livre, à sombra duma árvore. Carregamentos de algodão. Sanzalas.
A 110 km de Luanda há uma floresta de eucaliptos, ao longo da estrada.
Paragem para os soldados revistarem o autocarro (99 km de Luanda)
15:15
Botomona - O céu está coberto de núvens, que parecem flocos de algodão.
15:30
Catete - 60 km de Luanda. Vila sede do Concelho de Icolo e Bengo. Luz eléctrica. Alt. 70 m. Clima tropical regular. Passámos a 3 km da vila. Zona algodoeira, com uma produção média anual de 4000 toneladas.
Povoação indígena à entrada da vila, de quem vem de Luanda.
15:50 - 16:00
Km 44 - Merendámos - 1 laranjada. Fica no cruzamento da Estrada de Catete com a do Bom Jesus. Possui uma casa comercial. Não é povoação.
16:08
Desvio da EN nº 3, devido a reparações nesta. Neste sítio, quando fomos a Cambambe (em 17 de Julho) estava um automóvel virado, devido à má sinalização do desvio.
16:10
Regressámos à Estrada Nacional. (37 km de Luanda)
16:20
26 km de Luanda. Vegetação rasteira.
16:35
Viana - 16 km de Luanda. Povoação com. de 4ª. Apeadeiro.
16:40
Estalagem do Leão - Pousada a 17 km de Luanda, transformada em aquartelamento militar.
16:45
Grafanil - 7 km - Fábrica de explosivos e aquartelamento.
16:50
Entrámos em Luanda. Paragem no posto de controle militar, perto da F.T.U. (Fábrica de Tabacos Ultramarina)
Paragem ao pé da Esquadra da Polícia Móvel, onde desceram alguns passageiros
17:05
Chegada ao Largo das Ingombotas. Fim da viagem. O pai estava à nossa espera.
NOTAS
Além de nós, vinham no autocarro duas senhoras, soldados, três Brancos e diversos pretos. Eu vim sempre na cadeira do Fiscal.
Pela costa de Angola
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Fiz uma viagem de recreio a Lobito, Catumbela, Benguela e Moçâmedes. Não fui a Nova Lisboa, onde contava passar umas semanas, porque a minha mãe teve de regressar a Luanda e daqui embarcou para Lisboa. (NID - 1960.10.25)
Em 5 Ago 60 eu, a mãe e o Zé embarcámos no “Uíge” para uma viagem ao Lobito, Moçâmedes e Nova Lisboa. No dia seguinte chegámos ao Lobito (... que) visitámos de autocarro. Almoçámos no Restaurante Luso. Qualquer que seja o percurso que andemos de autocarro pagamos sempre 2$50. Não há cobradores. (...) A cidade do Lobito é airosa, com vários prédios de dois pisos, mas a maioria são vivendas térreas. Ruas largas e belos jardins. No dia 8 de Agosto, 2ª feira, chegámos a Moçâmedes. (...) Vimos a cidade, que é pequena mas airosa. (...) Visitámos o Forte de S. Fernando, o banco da “má língua", hortas, olivais e o deserto. (...) No dia 9 estávamos de novo no Lobito. Fomos a Benguela (bonita a estrada Lobito-Benguela) e a Catumbela. Benguela é uma cidade pequena. (...) Chegámos a Luanda às 16 horas de 10 Agosto e no dia seguinte a mãe seguiu, no “Uíge”, para Lisboa (Diário III - pag. 7/9)
Do Lobito ao Huambo
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A viagem [de barco "Infante D. Henrique)] correu bem. ([1]) Chegámos ao Lobito na 3ª de manhã. Desembarcámos e como não havia lugares nos hotéis acabámos por ficar na Pensão Ideal, que de ideal nada tinha. Era triste, com colchões mais duros que o meu, mosquitos... A comida é que não era má. (MNS - 1962.08.24)
A viagem [de barco "Infante D. Henrique)] correu bem. ([1]) Chegámos ao Lobito na 3ª de manhã. Desembarcámos e como não havia lugares nos hotéis acabámos por ficar na Pensão Ideal, que de ideal nada tinha. Era triste, com colchões mais duros que o meu, mosquitos... A comida é que não era má. (MNS - 1962.08.24)
De há dois anos para cá a cidade não se desenvolveu muito. Estão a construir um mercado novo, de linhas modernas, que fica defronte da Pensão. Fartei‑me de passear a pé, tendo por isso ocasião de verificar que há por aqui coisas que Luanda deveria ter: ruas arborizadas, bons jardins e cestos para o lixo (logo as ruas são limpas). Gostei bastante da Restinga, com casas engraçadas. ([2])
Embarcámos no comboio na 4ª feira à tarde. A carruagem estava reservada aos estudantes do Porto e tivemos de procurar outra. Por fim tudo se arranjou. Os estudantes ocuparam o refeitório fazendo dele, alguns, sala de estar. Só conseguimos jantar às 10. (...) A paisagem até Nova Lisboa é encantadora. Como 500 metros para cada lado da linha pertencem aos CFB ([3]) quase todo o percurso até à fronteira está ladeado de eucaliptos [que servem de combustível aos comboios e para fabrico de pasta de papel], segundo o que me disse o revisor da carruagem que durante a viagem me prestou muitos esclarecimentos. Antigamente a linha passava por florestas que foram abatidas para combustível às locomotivas de maneira que a Companhia fez o repovoamento florestal com eucaliptos. (MNS - 1962.08.24) [Orfeão Universitário]
NOTAS À VIAGEM DE COMBOIO - Foi uma pena a viagem ter sido feita de noite. Como a linha férrea é a subir, abrangem‑se grandes distâncias. À noite as fagulhas oferecem‑nos um aspecto curioso. O pessoal dos C.F.B. é muito atencioso e correcto. No Lépi há um rochedo com a forma duma cabeça de elefante, daí lhe vindo o nome de “TROMBA DE ELEFANTE”. O ponto mais alto da linha férrea fica a 1894 metros de altitude. (...) (Diário III - pag. 17/18 )
Não estou de acordo com o que disse acerca das fagulhas do comboio. Eu fiz a viagem quase toda ou na varanda da carruagem ou à janela. (Eu gosto de ver por onde ando). Tirando a cara e a camisa cheia de fuligem, nada me sucedeu. fiquei encantado com a paisagem., como já lhe devo ter dito. Na verdade, esta é muito melhor que as do Norte [de Angola], que eu conheço. (ASV - 1962.09.24)
[1] - Anteriormente fizera duas outras viagens de paquete, de Angola a Portugal e regresso, em 1949/50, respectivamente no "Mouzinho de Albuquerque" e no "Uíge". Da primeira viagem recordo apenas que não enjoei, enquanto a minha mãe passava os dias indisposta no camarote. Dessa viagem há fotografias do navio a zarpar do Porto de Luanda e minha, num dos decks, muito sorridente.
[2] - Como não havia quartos no Victoria Hotel, ficámos na Pensão Ideal, que de ideal nada tinha! Era uma pensão triste e suja. Da janela do nosso quarto, que ficava no 2º andar, vê‑se o novo mercado, em parte construído, um belo largo arborizado e, ao longe, a baía com o seu casario. O Lobito é uma cidade de ruas arborizadas e com jardins bonitos. Por toda a parte existem recipientes para o lixo, que em Luanda fazem muita falta. Tem dois cinemas, o Colonial e o Imperium. O almoço da Pensão era razoável (sopa de puré de feijão, carapaus fritos com feijão frade e batatas com carne guisada). Tencionávamos lanchar no Restaurante Luso, mas estava fechado por motivo de obras. Voltámos a pé para a cidade. A cidade lembra‑me Pointe Noire. (...) (Diário III - pag. 13/14 - 1962.08.21) (...) Deixámos as malas na estação e fomos lanchar à pastelaria “Tic Tac” (onde há uma horrível pintura na parede) (Diário III - pag. 15 - 1962.08.22)
[3] - Caminhos de Ferro de Benguela
Uma viagem de avião - Luanda - Lisboa
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A viagem correu optimamente, excepto quando sobrevoámos Lisboa. Devemos ter apanhado alguns poços de ar e parecia que o estômago me saía pela boca. Em Kano [Nigéria] apanhei um bocado de frio. (...) Atravessámos montanhas, ou melhor, sobrevoámos montanhas cobertas de neve e o Deserto do Saara. (...) A comida a bordo era para um pássaro. E paga um sujeito uns poucos de contos para isto.
No aeroporto estavam à minha espera a Bita, a Maria Luísa e a minha madrinha [Cristina Santos] (NSF - 1962.12.28)
Uma viagem de avião - Lisboa - Luanda
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O avião, o Super Constelation Infante D. Henrique, descolou [de Lisboa] à meia noite, com um atraso duns 15 minutos. ([1]) Foi neste avião que em Dezembro último vim para a Metrópole. Até Bissau, onde desembarcaram grande número de passageiros, o avião ia cheio. Não dormi mais dumas três horas. O barulho dos motores era ensurdecedor, mas depressa me habituei.
Deram um pequeno almoço antes da aterrisagem em Bissau. O aeroporto é simples, mas pelo que sei um dos melhores de África. Vi lá dois aparelhos de radar do exército. Estava calor.
Como já íamos atrasados não parámos em S. Tomé. Tive bastante pena de não ver o tio Jorge. A partir do meio dia a viagem tornou‑se deveras monótona. Conversava com o meu companheiro de viagem, um funcionário de Luanda, via a paisagem (só núvens ou mar) ou lia ("O Céu Não tem Favoritos", de Maria Remarque) É um pouco filosófico, mas não desgosto. Assisti ao nascer do sol, visto de 3 000 metros de altitude. É um espectáculo deslumbrante. Começa com um pequeno foco vermelho, que se alastra, como um grande incêndio (as minhas notas foram tomadas às 6 h 15 m de Lisboa). O céu até há pouco estrelado, mantém‑se escuro, talvez azul ou preto. Por fim todo o horizonte está vermelho e começam a distinguir‑se as núvens, num contra‑luz soberbo.
Chegámos a Luanda às 19 h 35 m (hora de Luanda). A cidade vista de cima é pouco iluminada. Mas de lado, parece um cintilar de pedras preciosas. Será um aspecto maravilhoso de Luanda que conservarei muito tempo. Um pôr do sol visto de avião também é um espectáculo agradável. (1963.11.24/26 - Diário III)
[1] - A primeira vez que andei de avião - avioneta - foi de Luanda para o Uíge, talvez em 1949. Dessa viagem recordo apenas um painel cheio de mostradores, o da cabine do piloto, com quem fiz toda a viagem, segundo a minha mãe. Gosto de viajar de avião, embora uma das viagens tivesse sido muito aborrecida, por alturas da guerra em Angola, quando os países africanos proibiram o sobrevoo dos respectivos territórios pelos aviões portugueses. Estes tinham de bordejar a costa africana. Salvo erro fizemos escala em Cabo Verde, de cujo aeroporto não podemos sair, fortemente guardado pelas forças militares. 19 horas de avião, sempre sentado, sem poder mexer, salvo nas idas ao WC, é obra!
De Lisboa ao Porto
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Falando como o senhor de La Palisse diremos que de Lisboa ao Porto podemos ir utilizando variadíssimos meios de transporte: barco, avião, comboio, automóvel...
Ou, o que será uma grande estafa, pode ir-se caminhado pelo seu próprio pé, se escravos não houver para transportarem a liteira. E a verdade é que há quem o faça, em magotes mais ou menos alegres ou macerados, peregrinos a caminho de Fátima, pela berma da estrada, alguns de mochila às costas e bordão na mão, confluindo para um 13 de Maio a 13 de Outubro, datas das aparições da Senhora que tomou o nome da terra, embora tenha aparecido na Cova de Santa Iria.
A viagem de comboio é descrita mais adiante. De automóvel, leva umas horas, sem necessidade de fazer testamento prévio, como no tempo do meu avô Luís, que me dizia que a viagem duraria... cinco dias (e cinco noites). Indo de automóvel, houve tempo que se poderia ir alongadamente pela costa, ou combinadamente, ao longo do Tejo para norte, depois pelo interior, inflectindo quase lá em cima para o litoral até ao Porto. Era o tempo da Estrada Nacional nº 1, quando a autoestrada ia apenas até Vila Franca de Xira para quem rumasse ao Norte, ou até aos Carvalhos, para quem do Norte quisesse vir por aí abaixo. Pela costa ou pelo interior, ambos os caminhos rumavam a Coimbra, a meio caminho com alguma boa vontade.
A viagem era uma festa, uma canseira ou uma sensaboria. Dependia do clima ou do tempo disponível. Passava‑se pelo interior das povoações, parava-se para meter gasolina, para comer ou devido aos engarrafamentos provocados pela estreiteza das vias, pelas carroças puxadas por animais ou devido a qualquer acidente rodoviário. Se tempo houvesse era mais demorada a paragem nas povoações ou pelo caminho para admirar a paisagem ou para pequenos desvios.
A chegada a Santa Apolónia era precedida pela lezíria, por vezes inundada, pelo rio Tejo aqui ou ali entrevisto, até começar a paisagem industrializada e desgraciosa desde Vila Franca de Xira, e zona oriental de Lisboa, com o seu emaranhado de linhas férreas. Em Vila Franca de Xira a ponte deixou de ter portagem para quem a atravessasse, mas nem os ventos do 25 de Abril lhe mudaram o nome como à de Lisboa. Esta deixou de ser de Salazar, mas aquela continuou a ser do Marechal Carmona!
Mas a caminho do Norte, Alenquer era uma visão agradável, as casas pela encosta acima como se fora uma cascata, à noite iluminada e, no Natal, com gigantesco presépio cheio de luz. Depois acabava a planície e lá se andava às curvas e contracurvas ou no sobe e desce das serras de Montejunto e de Candeeiros. Passava-se por Rio Maior, mais tarde conhecida como a capital da contra-revolução, com a célebre moca para espancar os comunistasAqui começa Portugal, isto é, acrescento, para quem fosse para Norte, porque para quem demandasse o Sul ali... acabaria Portugal e começariam a moirama e os infiéis. Mas rumando a Norte, a curiosidade era desperta pela Venda das Raparigas, pouco antes de Alcobaça ou da Batalha, pontos de breve paragem e visita se tempo ou inclinação para isso houvesse. e as placas de sinalização pichadas com
Mas a paciência perdia‑se de vez em Leiria, sempre uma estafa para atravessar, o trânsito condicionado pela estreiteza da ponte sobre o rio Lis quando não agravada por ser hora de ponta. Um breve relance ao castelo com a sua varanda de arcos ogivais, lá em cima, e ala que se vai fazendo tarde. Ao lado da estrada o castelo de Pombal chamava a nossa atenção, altaneiro no cume do monte, mas Conimbriga merecia mais um desvio e uma paragem para admirar as ruínas da velha cidade romana mais as muralhas que ainda existiam e o jardim dos repuxos.
Após Condeixa, finalmente Coimbra, reconhecível ao longe pela Torre da Universidade, lá no cimo, no local onde noutras terras está o castelo. Na Mealhada havia sempre muitos camiões e automóveis parados, para que os seus ocupantes comessem e bebessem nos restaurantes à beira da estrada, que não se pode impunemente andar com a garganta seca ou a barriga a dar horas. Seguiam‑se Malaposta (do tempo das diligências), Águeda, Albergaria‑a‑Velha, Oliveira de Azeméis, S. João da Madeira (que alívio, estamos quase a chegar!), Picôto e - finalmente - a então mini auto-estrada, cinco km dos Carvalhos à capital do Norte, onde se entrava atravessando a elegante ponte da Arrábida sob o rio Douro, sempre cheio de água mas sem ser o mar espelhado do enorme estuário do rio Tejo, com a ponte metálica de D. Luís para montante, que desde o século XIX une Gaia ao Porto, graças ao Engenheiro Gustave Eiffel.
Hoje a viagem faz‑se por auto‑estrada e o que se ganhou em comodidade e rapidez nem sempre compensa a monotonia e o passar ao largo destas povoações, afastadas porque para elas aceder é necessário procurar um acesso e por vezes andar muitos km pela estrada velha, para norte ou para sul. (Memórias de Viagem, 1997.11.16)
Viajando pela linha do Norte
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Às 8:30 tomámos o rápido da linha do Norte. Caía uma chuva miúdinha e no céu via-se um lindo arco‑íris. Matabichámos no bar da estação de Santa Apolónia, em, Lisboa, que é original, com motivos do caminho de ferro.
À saída de Lisboa passámos por um aeródromo militar. Monte Real era sobrevoada por aviões a jacto, da Base Aérea 5. A primeira paragem foi em Santarém. As cadeiras da automotora são mais espaçosas que as do rápido. Às 9:40 chegámos ao Entroncamento , a terra dos fenómenos. Ia tão entretido a ler que, entre Fátima e Pombal, passámos por um túnel sem eu dar por isso.
Antes de Pombal passámos por um outro que estava em obras. Nesta altura chovia. Às 11:10 chegámos a Alfarelos e pouco depois à estação de Coimbra B. O rio Mondego estava quase seco - e é um rio importante do continente! Passámos por Pampilhosa da Serra (11:43), Cúria (11:50), Aveiro (12:18), Estarreja, Ovar, Espinho, Granja (13:05), Vila Nova de Gaia (13:25), Campanhã e S. Bento (13:50). Na nossa carruagem seguiam 4 indianos que deveriam ter saído em Coimbra, mas por ignorância (passaram lá sem saber) não o fizeram e resolveram seguir até ao Porto. Muitas das estações do percurso tinham bonitos jardins. (1963.09.11 - Diário III)
No comboio, a caminho de Lisboa, pedi a um dos meus companheiros de viagem que me emprestasse as "Modas e Bordados" para folhear, pausa na conversa que mantínhamos desde o Porto. Agora o dia está maravilhoso e cheio de sol. (No Porto chovia a cântaros) Há já um bom bocado que deixámos Coimbra. O comboio desliza rápido, tac-tac, tac-tac. deixando para trás campos verdejantes, olivais e vinhedos, pinhais, alguns deles alagados, e casas dispersas na paisagem. Os meus vizinhos de compartimento dormitam, enquanto a sineta toca para o almoço. Daqui a uma hora chegaremos a Lisboa. (...) Os companheiros de viagem: a sra. D. Alice, ar aristocrático, minha velha conhecida do Porto, cheia de vivacidade, apesar da idade, rosto quadrado, sanguínea. O outro, desconhecido, deve ser um homem ligado à actividade comercial, pelo modo como veste e pelos apetrechos: óculos e lapiseira no bolso do lenço no casaco, pasta. Veste com pouca elegância, fato de um tecido acastanhado mesclado de azul e vermelho, colete cinzento de malha, gravata preta com duas listas - uma encarnada e amarela, estreita, outra mais larga, verde, junto ao nó. Sapatos castanhos, mal engraxados. Afinal a pasta continha um farnel embrulhado num guardanapo dentro dum saquito de plástico, que ele come, e que me ofereceu. (Isto faz‑me lembrar que tenho de ir ao bar comer uma sandes.
A D. Alice, o [jornal] "O 1º de Janeiro" nos joelhos, dormita, a cabeça apoiada na mão. Queixa‑se do frio, mas aqui para nós ainda bem que desligaram o aquecimento, pois isto já era um forno.
Chegamos ao Entroncamento são 12:40. Por causa das obras na linha, penso eu, o comboio vem atrasado. As casas, blocos uniformes, regularmente monótonos, as linhas, cruzando‑se e divergindo, cheias de carruagens, vagões e locomotivas, são uma nota diferente na paisagem, que desde há uns bons quilómetros é mais árida que no princípio da viagem. A linha férrea é uma ponte nos campos alagados, com água barrenta, levemente ondulada. Solitariamente, pequenas ilhas, renques de árvores de ramos desfolhados, cujos nomes desconheço. Já não se vêm no entanto árvores cortadas e oliveiras deitadas no solo, raízes desentranhadas pela força dos ventos, que no Porto e nos últimos dias sibilaram noites seguidas, infiltrando‑se pelas frestas das portas e janelas. Gostaria de andar num barquito por esses campos alagados. (NOT - s/data 1972/73 ?)
A viagem decorreu bem, embora maçadora. No compartimento, além de mim, viajavam dois rapazes sisudos e calados e uma rapariga, que não tinha culpa de ser feiosa e fortezita! Ia mesmo sentada à minha frente mas, contra o meu costume, não trocámos uma única palavra. Pensando bem, ela não era tão feiosa como isso, até tinha uns lindos olhos azuis e um sorriso bonito. Só sorriu uma vez, quando eu, com um ar muito circunspecto, fingia admirar a paisagem; eis senão quando aparece um malandro dum comboio, sem avisar, às apitadelas, que me fez dar um salto na poltrona. A muito custo lá consegui assumir um ar de dignidade ofendida, embora a vontade de rir fosse grande. Bem, lá chegámos a Lisboa, onde chovia a potes. Táxis, nem sombra; os que apareciam eram logo anexados. Mas... enquanto há vida há esperança e sempre apanhei um! (ASB - 1968.04.19)
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