quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Ao (es)correr da pena e do olhar (35)

* Victor Nogueira
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Não estava propriamente á espera de receber uma quilométrica carta tua, duma profundidade envolvente. Não, nada disso, que as férias fizeram se para descansar, com a leveza duma folha levada pela brisa! Mas ... ao menos a ligeireza dum olá na brevidade dum postalito! Enfim ...
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Não sei se terás regressado de Espanha e se andarás já em mudanças e decorações. Quanto a mim, acabei por não sair de Setúbal, salvo uma ida de Alcácer a Santiago de Cacém. As criancinhas não quiseram sair comigo, não aceitei dois convites e fiquei me por esta santa terrinha ás voltas com o computador, registando matéria prima para desenvolver em três livros: um de viagens e de estadias (subdivido em África e Portugal), outro de retratos e um terceiro de criticas cinematográficas, audições musicais e referencias bibliográficas. Desta vez deixei me de poesias e lancei me á prosa, através de re-leitura das cartas que escrevi com regularidade em 1975 e de 1968 a 1971 e quase diariamente entre 1973 e 1974. Aliás este espólio epistolar já deu origem a dois outros livros: Os dias da Revolução e Ao (es)correr da Pena. Material que não jaz, inédito, no fundo duma qualquer gaveta, mas sim, devido ás novas tecnologias, repousa nos "clusters" do disco rígido do computador e das disquetes de segurança.
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Farto de doze horas diárias madrugada dentro tique-taquendo o teclado, acabei por decidir passar a última semana de férias em Évora que foi para mim burgomedieval perdido na planície alentejana, base para incursões pelas terras circunvizinhas. Mas o homem dispõe e as alergias e constipações indispõem. Pelo que tive de passar a última semana em casa, de novo em cerrado tique-taque para afastar o tédio, cheio de pingadeira e com uma farmácia ambulante após uma consulta de 6 mil palhaços e o dobro em remédios.
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Pois é, o Rui não quis ir comigo para Lisboa, com cenas lancinantes pelo meio: que não conhecia lá ninguém, que em casa dos tios não tinha nada que fazer salvo ver televisão ou jogar no computador, que os amigos estão em Setúbal que queria ir á praia e passear com eles, que tinha de ir visitar a avó (materna) no Faralhão ! .... Lá se acordou que ficaria dois dias em Setúbal, com a irmã aqui em casa, iria dois dias para casa da avó e depois iria ter comigo a Lisboa. Mas entretanto desisti da minha ida a Lisboa. Sabes o que ele tem feito: passa o dia a ver televisão (não perde nada de desporto, ouve a mesma notícia nos vários canais e lê com maior desenvolvimento no RECORD, quando não está a jogar computador. Praia e casa da avó, nada! Amigos: jogavam á bola ao fim do dia ali no Parque da Lanchoa, mas entretanto zangou se com o grande, "velho" e vizinho Bruno. (ao fim de 16 anos descobriram que os feitios chocam se e a "separação" já tem dias).
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Bem, por aqui me fico.

(MCF) Setúbal, 1996 . SET . 07

1 comentário:

A OUTRA disse...

Adoro ler estes teus escritos.
Parece que estou a ver o Rui, porque será que a malta desta idade é quase toda igual?
Maria